São Paulo – O debate em torno da função que o BNDES desempenha ou deveria desempenhar tem recebido espaço relevante na imprensa desde que o governo Temer tomou o poder. Isso porque a atual administração traçou novas diretrizes para o banco de fomento.
No final de 2016, Temer determinou a devolução de R$ 100 bilhões do BNDES ao Tesouro Nacional. Além disso, promulgou a Medida Provisória 777, que estabelece o fim da taxa subsidiada de juros concedida pelo banco de fomento (TJLP), e cria a Taxa de Longo Prazo (TLP), que será definida pela inflação medida pelo IPCA acrescida de uma taxa de juros prefixada (título do Tesouro NTN-B). Na prática, a TLP será mais alta do que a TJLP.
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Na sexta-feira 7, divergências com o novo presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, em relação a mudanças na TJLP, levaram dois diretores do banco a pedir demissão. Nomeados pela antecessora de Rabello, Maria Silvia Bastos Marques, Cláudio Coutinho e Vinícius Carrasco ajudaram a conceber o plano de substituição da TJLP pela TLP e decidiram sair após declarações de Rabello de Castro questionando a mudança.
As dissonâncias internas levaram o jornal Folha de S.Paulo a publicar um artigo na coluna semanal Por quê?, da terça-feira 11: O BNDES vai insistir no erro?. O texto sustenta que a TJLP não pode mais seguir balizando os empréstimos do BNDES depois de 2018. “O governo não deve se meter a dar empréstimos com dinheiro do contribuinte porque (1) não há vantagem comparativa na medida; e (2) não visa eficiência na alocação de crédito. Como mostram os fatos recentes, muito desse crédito acaba ou enriquecendo os amigos do rei, ou indo parar na lata do lixo de projetos grandiosos, mas ineficazes do ponto de vista econômico.”
O economista do BNDES Marcelo Miterhof argumenta que os juros altos cobrados no Brasil exigem que o BNDES atue reduzindo a dificuldade de crédito ao investimento. “Porém essa situação não é permanente. Uma vez que a Selic caia, o custo fiscal dos empréstimos também cairá. A existência da TJLP significa dar prioridade ao investimento frente ao consumo. O investimento hoje gera emprego e renda; e, amanhã, capacidade produtiva e incorporação de progresso técnico, aumentando o potencial de crescer sob inflação baixa.”
Quem financiou o iPhone – Em artigo publicado também na Folha de S.Paulo, em junho, a professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo Laura Carvalho sustenta que a melhor forma de evitar a influência de grupos de alto poder econômico sobre a política industrial não é deixar de ter política industrial. “É, ao contrário, apostar em uma política industrial estratégica bem desenhada e definida para um longo horizonte de tempo. Até porque não há experiência histórica de países que tenham conseguido desenvolver setores de alta tecnologia ou de infraestrutura do Estado.”
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A estudiosa cita o livro O Estado Empreendedor. A obra da professora de economia da Universidade de Sussex (Reino Unido) Mariana Mazzucato mostra que o Vale do Silício é resultado de enorme intervenção estatal. “Toda a tecnologia do iPhone foi financiada por agências públicas ligadas ao departamento de Defesa dos EUA. Lá, o Estado também subsidia pesadamente setores chave como carro elétrico e energia solar. Aqui esse papel só pode ser desempenhado pelo BNDES”, opina a economista da FEA-USP
Miterfof reforça que bancos de fomento são necessários porque nem sempre o mercado privado tem interesse em financiar projetos que são ao mesmo tempo prioritários, mas de longo prazo e alto risco, como infraestrutura, inovação e meio ambiente. “No Brasil, esse problema é mais grave por conta dos juros altos. Mas todo banco de fomento conta com alguma vantagem de taxa, fiscal ou regulatória para apoiar os setores priorizados.”