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Chapéu
Conferência Nacional

#Mobilização em defesa do emprego bancário

Linha fina
Para fazer frente às novas tecnologias, luta dos trabalhadores também deve se inserir no mundo virtual, inclusive com ampliação dos espaços de debate em torno da importância dos profissionais para a segurança do sistema financeiro
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Foto: Anju

São Paulo - Fintechs não têm qualquer tipo de regulação ou segurança para transações financeiras. Uso de dados das redes sociais para conceder crédito pode criar uma nova bolha. Trabalhadores de unidades digitais já vivem uma rotina tão ou mais estressante e de pressão por metas que das agências físicas.

A partir dessas constatações, os sindicatos devem ampliar suas formas de ação e atuação para estar também próximos a esses trabalhadores do universo digital dos bancos e proteger os empregos diante das novas tecnologias.

Essa foi a tônica das apresentações feitas por Moisés Marques, diretor acadêmico da Faculdade 28 de Agosto do Sindicato dos Bancários de São Paulo, e Vivian Machado, técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) na Contraf-CUT, durante o painel Defesa do Emprego Frente às Novas Tecnologias. Essa foi a segunda mesa de debates do segundo dia da 19ª Conferência Nacional dos Bancários, no sábado 29, em São Paulo.

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“O movimento sindical deve trabalhar junto aos reguladores, como o Banco Central, exigir controle dos riscos dessas novas empresas digitais, das fintechs, como tem nos bancos. E isso se faz com emprego bancário”, afirmou o professor Moisés, falando de possíveis atuações dos representantes dos trabalhadores em defesa dos empregos da categoria. “Participar ativamente de audiências públicas sobre o tema, pressionar o Legislativo, criar canais de denúncias específicos para bancos digitais. Atuação sindical e mobilizações digitais também: #manifestação, #mobilização, #ação”, provocou, lembrando que o debate do assédio moral nas unidades digitais é fundamental, já que a integração de novas tecnologias tem aumentado riscos à saúde e levado a pressão ainda maior pela venda desenfreada de produto.

Robotização e precarização – A fala do professor sucedeu a de Vivian Machado, do Dieese, que apresentou a mudança na forma de atendimento dos bancos diante do uso cada vez mais exacerbado das tecnologias 4.0, conhecidas também como a quarta revolução industrial.

“Bancos estão se transformando em plataformas 100% digitais. Em 2016, foram R$ 18,6 bi de investimentos em novas tecnologias”, enumerou Vivian. Diante desse quadro, um terço das transações já são feitas via mobile, enquanto a quantidade de agências caiu de 18% para 8%.

Os trabalhadores transferem, ainda, seu conhecimento para as máquinas, que aprendem com os dados inseridos. No Bradesco, a BIA é o primeiro caso de utilização por uma empresa brasileira do Watson, computador da IBM. Está sendo abastecida pelos gerentes do Bradesco e já responde 94% das dúvidas dos clientes.

No Santander, o “bancário cyborg”, que antes de desdobrava para atender todo mundo, agora o faz por vários canais digitais: “o humano com tecnologia acoplada para ter capacidade de atendimento elevada”, explica Vivian.

Ela lembra que os bancos estão propondo novos modelos de atuação, exigindo dos profissionais estarem integrados à nova forma de trabalhar. “Contratações por demandas específicas, temporárias, em home-office, tudo isso deixa claro porque os bancos defenderam tanto a reforma trabalhista”, critica, lembrando que o BB, por exemplo, passou de oito funcionários em home-office em abril 2015, para mais de 100 no fim do mesmo ano.

E relatou a visita a uma agência digital do Itaú, pelos técnicos do Dieese. A unidade em Santa Cruz, no Paraná, tem 22 trabalhadores, em horário flexível (funciona das 8h às 22h), 70% com idades entre 18 e 25 anos, a maioria somente há dois ou três anos no banco.

“No Itaú já são 144 agências digitais com 3.168 trabalhadores (4% do total). Cada gerente atende 1.200 clientes: 50% deles via mobile”, lembra Vivian.

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Briga contra os riscos – A maioria dessas transações digitais, no entanto, não envolve operações financeiras. “Boa parte da população tem receio, com razão, por isso não faz transação financeira por celular”, observou Moisés, destacando que são transações irreversíveis, sem a segurança devida e que deixam a privacidade comprometida. “Gastos com violação de dados são maiores nas plataformas tecnológicas, podendo causar grandes prejuízos. Fraudes virtuais cresceram 500% em um ano (2015) no Brasil.”

E a arma contra isso é o emprego bancário, disse o professor, reforçando que a briga dos trabalhadores não é nem tem de ser com a tecnologia, mas com os riscos dela. “Temos de mostrar aos clientes que não estão ganhando nada com isso.”

E ainda estão gastando, enquanto os bancos seguem ganhando e muito. Quando o cliente usa o próprio celular para fazer o serviço bancário, o Bradesco, por exemplo tem um custo de somente 3% do que seria o atendimento presencial numa agência, informou a técnica do Dieese.

Novos trabalhadores – Moisés traçou um breve perfil da geração, conhecida como millenials, que tem entre 18 e 30 anos e está entre o principal público contratado pelos bancos. “Não querem ter casa, carro, são conhecidos por ser a geração ‘eu’, mudam muito de emprego, são nativos digitais, usam internet para tudo.”

Mas, de acordo com estudo realizado em 2016 pela Universidade de Harvard (EUA), 51% dos jovens entre 18 e 29 anos não apoiam o sistema capitalista. “Ou seja, há um nicho para ser explorado aí”, disse Moisés, sugerindo o uso de games de mobilização com função política e social.

“São trabalhadores que não gostam de compromisso, gostam de flexibilidade, inclusive no trabalho. São multitarefas”, descreve Moisés sobre essa geração de novos profissionais. E há uma “infantilização” das relações trabalhistas que interessa muito aos empregadores, disse o professor, mencionando exemplos de recrutamentos que brincam com filmes, falam em ser dono da agenda, trabalho como extensão da diversão. “Chamam de consultor e tratam direitos como meros detalhes, como uma gestão do direito trabalhista que na verdade é precarização.”

A categoria bancária, hoje, é formada principalmente por gerentes. Desde 2012, apesar de terem lucros crescentes, os bancos múltiplos com carteira comercial (o que exclui a Caixa) extinguiram 53.216 postos de trabalho.

A Organização das Nações Unidas (ONU) prevê 40% de empregos a menos até a metade do século. O Fórum Econômico Mundial, de Davos, previu cinco milhões de empregos a menos até 2020, tudo em função das novas tecnologias.

Diante disso, o movimento sindical precisa aprofundar os debates junto aos trabalhadores e toda a sociedade, sugeriram os palestrantes. Quem vai se apropriar dos ganhos advindos do uso dessas novas tecnologias, qual nível de capacitação será exigido dos trabalhadores, como os sindicatos podem acompanhar? E os clientes, vão ganhar com essa redução de custos dos bancos, como deveria ser? A nova conformação do sistema financeiro atenderá a população de baixa renda?

“Tem saída, sim. Não vamos cair”, ressaltou o professor Moisés, estudioso do tema, lembrando que ao longo da história as pessoas acreditaram em anúncios sobre as novas tecnologias que nunca chegaram a acontecer de fato. “Não vamos brigar com os efeitos da tecnologia, mas vamos achar saídas em meio a tudo isso aí.”

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