São Paulo – Ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) reforça o que o Sindicato vem dizendo há muitos anos. Os correspondentes bancários (CBs) representam uma “terceirização ilícita” da atividade-fim dos bancos e “a aniquilação da categoria dos bancários”.
O MPT pede o reconhecimento desses trabalhadores como bancários, o que significa pagamento de diferenças salariais, auxílio-refeição e horas extras e o reconhecimento da jornada especial de trabalho de seis horas. E requer a decretação da ilegalidade dos correspondentes, que em agosto de 2013 somavam 364 mil postos de serviço. Contratados pelas instituições financeiras, fazem o papel de bancos em todo o país.
“Sempre afirmamos isso: correspondente bancário é ilegal. Não tem nada que permita a existência deles do jeito que está. O sistema financeiro lida com sigilo bancário e essa atuação ampla dos correspondentes representa risco ao sistema”, afirma a presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, lembrando que a responsabilidade de qualquer problema nesse sentido é dos bancos e do Banco Central (BC).
A ação do MPT foi ajuizada no Tribunal Regional do Trabalho da 14ª região, em Rio Branco, no Acre. Requer o pagamento de R$ 6,4 bilhões em indenizações contra o BC, a ECT (Empresa de Correios e Telégrafos) e as seis maiores instituições financeiras do país: as públicas Banco do Brasil e Caixa, e as privadas Itaú, Bradesco, Santander e HSBC. A multa por descumprimento prevê R$ 10 milhões por dia.
O MPT quer que ação obtenha abrangência nacional e aguarda o resultado do recurso da decisão do juiz Edson Carvalho Barros Júnior, da 4ª Vara do Trabalho no Acre, que enviou o processo para a Justiça Federal por se declarar juridicamente incompetente para julgá-lo. “Recorremos, porque a ação é de competência da Justiça do Trabalho”, disse o procurador do Trabalho Marcos Cutrim, que assina a ação com mais 30 integrantes do Ministério Público do Trabalho.
Terceirização – Após três anos de investigação, o MPT constatou que os correspondentes bancários são vendedores de concessionárias de veículos, lojas de varejo, agências de turismo, atendentes de casas lotéricas, dos Correios, lan houses, caixas de supermercados, balconistas de farmácias e padarias. Fazem serviços de bancários, mas não têm direito às conquistas da categoria. Ou seja, não têm jornada de trabalho reduzida, não têm participação nos lucros e resultados, além de não terem direito à segurança nos postos de atendimento aos clientes. Exercem todas as atividades de bancários e financiários, mas recebem como vendedores.
“Os efeitos perniciosos dessa terceirização são, principalmente, a redução ou a aniquilação dos direitos sociais dos trabalhadores dos correspondentes bancários e a precarização dessas relações de trabalho. Há também uma discriminação social. Enquanto a população rica é privilegiada com agências luxuosas com toda segurança, o cidadão de baixa renda é obrigado a realizar suas operações bancárias em pequenos estabelecimentos expostos a assaltos e a trabalhadores despreparados para a prestação de serviços bancários. É um verdadeiro apartheid social”, destaca o procurador.
Transgressão – Segundo Cutrim, o mais agravante é que o Banco Central promove e incentiva a transgressão aos direitos sociais, ao permitir a terceirização da atividade-fim das instituições financeiras por meio da contratação de correspondentes bancários.
Em relação à argumentação de que a bancarização chega aos locais mais distantes do país, beneficiando a população de baixa renda, o procurador do Trabalho contesta com dados do relatório “Atividades bancárias sem agências e a proteção ao consumidor no Brasil”, publicado em 2009 pelo Banco Central e o Consultative Group to Assist the Poor (CGAP), centro independente de pesquisa e políticas dedicado a promover acesso financeiro para os pobres do mundo. Os números mostram que 47,84% dos correspondentes bancários estão na região mais rica e populosa do país, o Sudeste, onde vivem 42,3% dos brasileiros. “Isso afasta – desde logo – o argumento de que o correspondente bancário é inteiramente voltado para promover o acesso financeiro para os pobres”, ressalta Cutrim, lembrando que na década 2000/2010, o número de correspondentes bancários aumentou 1.103,3%, enquanto o quantitativo de agência bancárias, 20,8% (dados da Febraban).
Em reportagem da Folha de S.Paulo, e a federação dos bancos (Febraban) manifestou-se em nota, ao jornal, em nome das instituições citadas. Segundo a entidade, a contratação dos correspondentes está regulamentada por uma resolução do Conselho Monetário Nacional de 2011 e “constituem uma inovação financeira que, por diminuir a necessidade de escala na oferta de serviços financeiros, contribuem para facilitar e ampliar o acesso da população a esses serviços, principalmente em áreas distantes e carentes”.
Os Correios, que prestam serviços de correspondentes para o Banco do Brasil por meio do Banco Postal, informaram ao jornal que estão autorizados por uma portaria do Ministério das Comunicações e duas resoluções do BC. “Os principais correios do mundo têm importante papel na inclusão financeira de populações de baixa renda, e por esse motivo a implantação de bancos postais é incentivada pela ONU e pelo Banco Mundial.”
Indenização – A Constituição Federal é imperativa ao exigir, no artigo 192, que o sistema financeiro nacional seja estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes e instituições que o compõem. “As investigações comprovam que o sistema bancário no Brasil fornece crédito caro ao consumidor e às empresas, o atendimento é precário, e essa política de terceirização despreza o valor social do trabalho, contribuindo para a exclusão social de trabalhadores e clientes”, afirma o procurador do Trabalho Marcos Cutrim.
O valor da indenização pedido na ação civil pública foi calculado em 10% do lucro líquido das instituições obtido no ano 2012.
Redação com informações do Ministério Público do Trabalho e da Folha de S.Paulo
* Atualizada às 17h50 de 30/8/2013