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Chapéu
Vacinação

Descaso do governo e descuido das famílias podem levar a epidemia de sarampo

Linha fina
Marilda Siqueira, virologista da Fiocruz, diz que doença que havia sido erradicada recentemente pode voltar, porque autoridades públicas, médicos e famílias relaxaram nos esforços de imunização
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Foto: Agência Brasil

A pesquisadora Marilda Siqueira, que comanda o Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo da Fundação Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) atribui à "redução da cobertura vacinal" o atual surto de sarampo, que atinge o Brasil, além de países da América Latina como Colômbia e Venezuela. A doença, que havia sido erradicada, após esforços de vacinação na década de 1990, volta a assolar a região, com riscos inclusive de se tornar uma epidemia. 

A reportagem é da Revista IHU ON-Line e foi replicada na Rede Brasil Atual

A virologista explica que o sarampo é uma doença "altamente contagiosa", e pode se alastrar facilmente em meio a uma população que não estiver efetivamente imunizada. Segundo ela, a queda na cobertura vacinal deve ser atribuída a fatores conjugados, que incluem desde problemas de distribuição e falta de planejamento de longo prazo por parte do Ministério da Saúde, passando pela desatenção de médicos e enfermeiros, que costumam encarar doenças infecciosas como um assunto do passado, e também das famílias, que se deixam levar por boatos sobre a suposta ineficácia ou riscos da vacina ou não esquecem de levar seus filhos para serem imunizados.

Marilda lembra que, em 1992, o Brasil realizou uma bem sucedida campanha de vacinação em massa que resultou na imunização em 98% das crianças e adolescentes menores de 14 anos de idade. O modelo foi replicado em diversos países e, em 2016, as Américas haviam conseguido inclusive certificado internacional que comprovava a erradicação da doença em todo o continente. 

"Isso foi um avanço enorme para as Américas e agora estamos em vias de perder essa certificação, porque a Venezuela está com um surto ou uma epidemia de sarampo há mais de um ano, o Brasil está há praticamente seis meses com um surto de sarampo, a Colômbia também e já foram detectados casos em outros países sul-americanos. Não podemos retroceder e achar que teremos, de novo, o sarampo nas Américas, mas tivemos quatro óbitos já este ano no Brasil."

A primeira dose da vacina contra o sarampo deve ser dada à criança quando completa o seu primeiro ano de vida, e a segunda dose, três meses depois. Ao tomar a vacina, a pessoa está imunizada e passa então a produzir anticorpos contra o vírus, impedindo também a transmissão para outras pessoas. 

"Nem sempre a vacina é encontrada regularmente em todos os postos de saúde nos últimos anos. Então, tem o problema de distribuição dessas vacinas, assim como o de monitoramento das coberturas vacinais pelo Ministério da Saúde. Tem uma outra questão, que é a responsabilidade dos profissionais de saúde, porque não são todos os pediatras e enfermeiras que estão insistindo com as mães que as crianças têm que estar com a carteira de vacinação em dia. Existe o pensamento de que a doença não circula mais e por isso não é preciso tomar a vacina", explica a especialista. 

Ela cobra que os postos devem estender seus horários de funcionamento, que hoje atendem em horário comercial, para permitir que pais cumpram com o dever de vacinar os filhos, sem se comprometerem com faltas no trabalho. "Hoje em dia uma mãe que trabalha tem que ir todos os meses, pelo menos, de uma a duas vezes por mês, aos postos de saúde para fazer as vacinas do filho. Justificar nas empresas essa saída mensal para vacinar os filhos, e justificar ainda mais uma ou outra saída do trabalho porque a criança fica doente — o que é normal em crianças pequenas — é muito pesado para muitas mães. Por isso, os postos têm que ter um horário de atendimento mais de acordo com a realidade da população."

Marilda Siqueira defende também que as secretárias estaduais e municipais de saúde e educação deveriam elaborar planos de ação para que as escolas verificassem as cadernetas de vacinação, e solicitassem aos pais que levassem para vacinar as crianças que não estivessem com a imunização em dia, sem realizar contudo qualquer tipo de ação que restringisse o acesso delas aos locais de ensino.

Confira a entrevista completa na Revista IHU On-line 

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