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Defender o SUS é defender um país melhor para viver

Linha fina
Em entrevista, o médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, Gonzalo Vecina, explica a abrangência do Sistema Único de Saúde e sua importância para a totalidade da população brasileira
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Foto: TCM-SP

“Se nós queremos um país melhor para viver, nós temos que ter um país no qual tenhamos acesso à assistência à saúde universal e gratuita. Não tem saída para isso. Não adianta imaginar que vai ter plano de saúde meia boca para uma parte da população ou qualquer alternativa que não seja um sistema de saúde único.” 

Desta forma, o médico sanitarista, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP e um dos fundadores da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Gonzalo Vecina, resumiu a importância da sociedade assumir a defesa do Sistema Único de Saúde (SUS), que teve na Constituição de 1988 sua pedra fundamental com a definição de que "a saúde é direito de todos e dever do Estado" (art. 196).

Vecina explica que, ao contrário da percepção da maior parte da população, as atribuições do SUS não ficam restritas à assistência médica. 

“O SUS é responsável por um conjunto muito amplo de ações. As ações em saúde pública não abrangem somente as ações de assistência médica. Temos toda área de vigilância epidemiológica, vigilância sanitária, verificação da qualidade de água e alimentos, fornecimento de vacinas, controle de zoonoses. É muito mais amplo. Não existe um cidadão que pode dizer que não é usuário do SUS”, esclarece o médico. 

De acordo com o professor da USP, o SUS sofre com o subfinanciamento, situação que se agravou após a aprovação da PEC do Teto, que congelou investimentos sociais públicos por 20 anos.

“O SUS hoje, somando as três esferas de governo, deve estar colocando R$ 250 bilhões por ano para atender 200 milhões de habitantes, o que dá mais ou menos R$ 1.000 per capita. A assistência médica privada coloca R$ 180 bilhões para atender 50 milhões de brasileiros, sendo só assistência médica, o que dá mais que R$ 3 mil per capita. Uma manifestação cabal do subfinanciamento do SUS (...) A PEC do Teto é uma sentença de morte. E tem espertinho que diz que a PEC do Teto não fala em Saúde. Não fala. Porém, a Saúde está sendo afetada assim como toda a sociedade”, critica.

“É óbvio que a questão do sarampo tem uma questão individual, que são pais que por diversas razões não levam seus filhos para tomar vacina. Porém, tem um componente de uma presença instável do Estado. O Estado, nos últimos cinco anos, diminuiu a cobertura de vacina. Faltou um conjunto de mecanismos para manter a população vacinada. A PEC do Teto tem responsabilidade nisso com certeza”, acrescenta. 

Para além dos problemas de subfinanciamento e de gestão do SUS, que impedem a completa efetivação dos seus três pilares – universalização, integralidade e igualdade – Vecina defende que falta para a sociedade brasileira a percepção da importância de defender um sistema universal e gratuito de Saúde. 

“Quando você olha o sistema de saúde inglês, no qual se baseou o SUS, ele existe desde 1948. Passou Margaret Thatcher, Tony Blair, passou um monte de gente boa e ruim, e nenhum ousou mexer no National Health Service. Eles sabem a importância que a sociedade inglesa dá ao seu sistema de saúde. Aqui, no Brasil, nós temos dos 200 milhões de habitantes, 50 milhões que acham que não dependem do SUS, embora dependam. E a opinião dessas pessoas sobre ter ou não do SUS é de que tanto faz, ´eu tenho plano de saúde´. Essa é uma das razões pelas quais nós não estamos construindo um sistema de saúde universal que mereça esse nome no Brasil. Por falta de envolvimento da população na definição daquilo que ela quer ter e vai aceitar financiar como fundamental para construir uma sociedade mais civilizada”, conclui o médico sanitarista.
 

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