
A 27ª Conferência Nacional dos Bancários concluiu seu primeiro dia de debates neste sábado (23). O encontro acontece no hotel Holiday Inn, em São Paulo, e reúne 629 delegados de todo o país para discutir os desafios do presente e as perspectivas para o futuro bancário.
Os trabalhos tiveram início ainda no período da manhã, quando foram apresentados os resultados da Consulta Nacional dos Bancários 2025. Com 33.482 respostas, o levantamento mostrou que, ao contrário do que a forte campanha contra a CLT possa indicar, a grande maioria dos respondentes (69,7%) prefere seguir trabalhando com carteira assinada. Apenas 3% dos participantes afirmaram preferir trabalhar como Pessoa Jurídica e 6,2% gostariam de abrir sua própria empresa.
Sobre as prioridades da luta sindical nos próximos anos, a maioria das respostas apontou ganho real nos salários, garantia de emprego e PLR. Em relação à isenção de Imposto de Renda para salários até R$ 5 mil, proposta pelo governo Lula, 90% dos participantes classificam a medida como importante ou muito importante. O aumento na tributação sobre os mais ricos é aprovado por 75% e 95% consideram a isenção de IR sobre PLR importante ou muito importante.
Brasil soberano e democrático

A primeira mesa contou com a participação do professor, escritor e historiador João Cezar de Castro Rocha. O convidado abordou os riscos para a democracia e soberania brasileira impostos pela extrema direita, que avança ao redor do mundo por meio de uma estratégia pautada em fake news e autoritarismo.
"O projeto da extrema direita é conquistar o Senado para alterar a composição do STF, pois ela só manteve o poder nos países em que manietou o judiciário. Foi assim com Viktor Orban, na Hungria, e com Nayib Bukele, em El Salvador. Se a extrema direita tiver essa maioria no Senado, a ditadura terá início mesmo que não estejam no executivo. Temos que estar preparados para lutar pela soberania brasileira por todos os meios necessários", afirmou Castro Rocha.
Apesar do cenário desafiador, o professor se mostrou otimista com a vitória do campo democrático. Segundo Castro Rocha, é necessário fortalecer a democracia brasileira enquanto promotora de direitos à população, e não apenas como uma questão limitada às eleições.
"Temos nos concentrado demais na democracia formal. A população brasileira nunca experimentou, de fato, a democracia enquanto acesso a direitos. No dia em que o povo brasileiro souber que a democracia é também o acesso fundamental a um conjunto indispensável de direitos, a extrema direita será apenas uma memória triste do passado."
João Cezar de Castro Rocha
Neiva Ribeiro, presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, conduziu a mesa com o professor Castro Rocha. Em sua avaliação, o debate sobre a defesa da democracia e da soberania brasileira é fundamental para a preservação dos direitos da categoria bancária, uma vez que não há livre negociação e atuação sindical no autoritarismo.
"Para termos direitos, precisamos ter democracia e negociação coletiva. Se as instituições não forem respeitadas, não teremos nada disso. Então as palestras de hoje são muito boas porque ampliam a nossa visão, nos ajudam a entender o que está por trás de muitos ataques que sofremos. E isso contribui para fortalecer e aumentar nossa mobilização, melhorar nossa comunicação e assim atingir nossos objetivos: melhores condições de trabalho, sindicato forte, país soberano e país democrático", analisa Neiva.

Inteligência artificial, impactos e regulação
Na segunda mesa, o assessor da Secretaria de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, Lucas Leffa, abordou os avanços da inteligência artificial e seus impactos sobre a sociedade. Ele destacou os riscos da IA reproduzir discriminações e opressões, ser utilizada para golpes e acabar com empregos. Por conta disso, Leffa ressaltou a importância das articulações do Governo Federal para a aprovação do Projeto de Lei 2.338/2023.
"A questão do trabalho tem uma seção específica no projeto de regulamentação da IA. Ela determina o desenvolvimento de diretrizes para mitigar os potenciais impactos negativos aos trabalhadores, em especial os riscos ao emprego, além de diretrizes para valorizar os instrumentos de negociações e convenções coletivas, fomentar programas de capacitação para trabalhadores e potencializar os impactos positivos aos trabalhadores, como melhoria da saúde e segurança no local de trabalho", explicou Leffa.
Por um sistema financeiro a serviço do desenvolvimento

A terceira mesa reuniu Gustavo Cavarzan, doutor em Economia Social e do Trabalho pela Unicamp e técnico do DIEESE, e Moisés Marques, doutor em Política Internacional e professor da FespSP. De acordo com Marques, o Banco Central tem sido ineficiente na regulação do setor financeiro, permitindo que as fintechs operem sem a devida fiscalização e sirvam aos interesses do crime organizado.
O professor também criticou a autonomia do BC citando o conflito de interesses com agentes do mercado. Nesse sentido, Marques mencionou o fato de Roberto Campos Neto ter assumido um importante cargo no Nubank pouco depois de deixar a presidência do BC. "A autonomia do Banco Central deveria ser uma autonomia republicana e não uma autonomia capturada pelo setor financeiro."
Gustavo Cavarzan criticou a política de juros do Banco Central. Em sua avaliação, o BC observa apenas a inflação e a opinião do mercado financeiro, via boletim Focus, ao definir a Selic. Com isso, a taxa de juros atinge níveis que travam o desenvolvimento econômico. Ao fim de sua apresentação, o economista apresentou propostas para melhorar a atuação do BC.
"Sugiro a ampliação do Conselho Monetário Nacional, fim do descasamento de mandatos entre o presidente da república eleito e a diretoria do BC, regulação das fintechs, revisão da meta de inflação para algo em torno de 4% com tolerância de 2 p.p., elevação da quarentena dos membros do BC, mecanismos para que o BC cumpra também sua função de fomentar o pleno emprego e também mecanismos para impedir a aplicação de juros abusivos."
Gustavo Cavarzan
Novas tecnologias e emprego bancário

Encerrando a programação, a quarta mesa reuniu as economistas do DIEESE Vivian Machado e Rosangela Vieira dos Santos, ambas mestres em Economia Política pela PUC-SP. As pesquisadoras apresentaram dados sobre os impactos da digitalização no setor bancário, com o domínio das operações virtuais sobre as presenciais e o consequente fechamento de agências.
"Com todas essas transformações, os lucros dos cinco maiores bancos do país cresceram substancialmente nos últimos anos. Em 2024, isso não foi diferente. Juntos, os cinco bancos somaram R$ 126,7 bilhões, com alta média de 18% em doze meses. Por outro lado, desde 2016, foram fechadas 6.700 agências bancárias, uma redução de 30%", explicou Vivian Machado.
"Entre 2020 e o primeiro semestre de 2025, a categoria bancária perdeu 20.739 empregos. As mulheres foram as mais afetadas, representando 18.764 empregos perdidos nesse período. Isso ocorre porque a maioria dos desligamentos se concentra nas ocupações de caixas, escriturários e gerentes de conta, justamente onde a maior parte dos profissionais é mulher, 58%", demonstrou Rosangela Vieira dos Santos. Na visão da economista, a saída para a redução do emprego bancário passa pela redução da jornada de trabalho, que proporcionaria mais vagas e melhora na qualidade de vida.
A Conferência Nacional será concluída amanhã, dia 24 de agosto, quando será apresentado e aprovado o plano de lutas da categoria, juntamente com as resoluções e moções. Acompanhe as atualizações em spbancarios.com.br
