São Paulo - As empresas falam de sustentabilidade e de responsabilidade social por uma estratégia de mercado e não necessariamente por se preocuparem com políticas internas que abordem o aspecto integral da saúde do trabalhador. Esta é a opinião da médica e pesquisadora Maria Maeno, da Fundacentro, Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho, ligada ao Ministério do Trabalho e Emprego de São Paulo.
Segundo Maria, “há um interesse comercial, ou seja, faz bem para o consumidor comprar um produto que, teoricamente, não causou impacto no ambiente e nem a morte ou o adoecimento de algum trabalhador. Mas isso não ocorre de fato, pelo menos em muitas empresas que estão sendo estudadas e que, ao contrário do praticam, afirmam ser sustentáveis”.
Confira a entrevista exclusiva concedida ao portal da CUT/SP, onde a pesquisadora aborda as práticas do mundo empresarial, bem como os desafios encontrados no sistema público de saúde.
CUT/SP: Sobre a saúde do trabalhador, há uma falsa publicidade das empresas quando estas expõem iniciativas em prol à sustentabilidade?
Maria Maeno: Depende do que as pessoas entendem por este termo. O que a gente observa é que a sustentabilidade no tripé economia, social e ambiental – as duas últimas incluindo a saúde do trabalhador e o ambiente de trabalho – não encontra amparo nas reais condições de trabalho e tampouco se refere aos impactos ambientais que essas empresas causam. Então, fala-se de uma coisa que não tem correspondência na realidade.
Quando o assunto é saúde do trabalhador, a atuação das empresas ‘sustentáveis’ no Estado de São Paulo costuma ser o indivíduo e não o coletivo?
Totalmente. Existem categorias de trabalhadores que têm, por exemplo, problemas psíquicos, como depressão. Há estatísticas da Previdência Social que apresentam isso. O que acontece é que o responsável pela administração pública ou privada diz é que a depressão é uma coisa muito comum na sociedade. Ou seja, que todas as pessoas costumam ter esse problema e não é um reflexo do trabalho. Não é verdade, pois muitos trabalhadores não se sentem realizados nos locais de trabalho, além do fato de ganharem quase sempre menos do que precisariam.
Fora o aspecto financeiro, questão também central, pode citar outros problemas que costumam afetar os trabalhadores?
Quando se estuda o dia a dia dessas pessoas, se observa que elas trabalham em um local que exerce uma pressão muito grande e desvaloriza o trabalho realizado e o próprio trabalhador. Pelas pesquisas já feitas, esses fatos levam muitos a terem um transtorno depressivo, distúrbios de sono e a recorrerem até mesmo ao alcoolismo e a outras drogas. As empresas colocam muitas vezes o alcoolismo como uma questão individual, mas a gente sabe que é um produto do meio ambiente e de suas relações sociais e de trabalho. Por isso, o enfoque coletivo é fundamental para que possamos combater de uma forma efetiva a individualização dos problemas. Isso deve ser uma política das empresas.
Como estão os espaços que atuam no aspecto da saúde do trabalhador? Muitos apresentam práticas despolitizadas?
Existem órgãos, como o SESMT [Serviço de Medicina e Segurança do Trabalho], concebidos para fazer o controle da saúde dos trabalhadores do ponto de vista da empresa. Não podemos dizer nesse caso que há uma despolitização, mas a existência de instrumento empresarial para que haja um controle da mão de obra dos trabalhadores do ponto de vista da empregabilidade. Do ponto de vista do Estado, o interesse real deste deveria ser uma inserção grande na saúde pública e no controle das doenças, dos acidentes e das condições de trabalho das empresas. Porque essas corporações produzem doentes que vão para o SUS [Sistema Único de Saúde]. Nesse sentido, a forma do SUS diminuir o seu gasto seria aumentando as ações de promoção de saúde e de prevenção de acidentes e doenças ocupacionais.
O SUS precisa melhorar nesse aspecto?
O SUS atua pouco nisso, ainda é insuficiente. O Estado, na verdade, não tem uma política de controle das condições de trabalho porque acaba cedendo para os interesses econômicos dessas empresas. Governadores, por exemplo, dificilmente vão se confrontar com empresas em geral que subsidiaram a sua campanha. A sociedade é quem precisa dizer que não quer que as empresas se instalem desse jeito. Afinal, o Estado não é neutro, ele é uma síntese de interesses conflitantes e, por isso mesmo, os partidos políticos, os representantes nos conselhos de saúde, os sindicatos e os movimentos sociais precisam estar envolvidos e dizer quais são os reais interesses da classe trabalhadora e da maioria da população.
Vanessa Ramos, da CUT São Paulo - 13/11/2013
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Maria Maeno, pesquisadora da Fundacentro, diz também que problemas de saúde muitas vezes são ocasionados por pressões no ambiente de trabalho
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