A luta para derrotar os governos neoliberais, as privatizações e na defesa de empresas públicas não é somente dos trabalhadores brasileiros, mas sim de toda a América Latina. Essa constatação se deu durante a oficina O papel dos bancos públicos na retomada econômica e social pós pandemia, do Fórum Social Mundial, ocorrida na tarde desta sexta-feira 29.
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Fechando os debates, a mesa mediada por Guillermo Maffeo, diretor Regional da Uni Américas Finanças contou com a participação de representantes do Chile, Peru, Argentina, Costa Rica e Uruguai, além do Brasil, que com unanimidade defenderam os bancos públicos, especialmente durante a pandemia.
A presidenta da Uni Finanças, Rita Berlofa, que vem acompanhando a crise mundial causada pela pandemia do coronavírus, destacou que a devastação na economia global atinge em cheio os países em desenvolvimento, em especial os da América Latina, e que a retração do PIB em 2020 afetou ainda mais os trabalhadores que estão na informalidade, na pobreza e na miséria.
"É evidente que a participação do Estado e bancos públicos, mesmo que pequena no continente, foram responsáveis por fazer chegar o socorro aos pequenos e micro empresários, aos desempregados e aos mais necessitados. Na crise, o Estado não pode contar com os bancos privados. Eles drenam o dinheiro e inviabilizam a capacidade criativa do governo de financiar políticas necessárias de sobrevivência, como na crise que vivemos hoje. Sem os bancos públicos é muito difícil haver infraestrutura, saúde e educação, e em muitos pequenos municipios a população conta somente com os serviços desses bancos, que promovem o acesso a bancarização, ao desenvolvimento regional, facilidade de acesso ao crédito e de programas sociais. Por isso, todos os trabalhadores, de todos os setores, devem concentrar seus esforços na defesa e no fortalecimento dos bancos públicos".
A presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região, Ivone Silva, lembrou que durante a crise de 2008 se o Brasil não tivesse os bancos públicos fortalecidos o país teria quebrado. "Na época, o presidente Lula baixou os juros do Banco do Brasil e Caixa, aumentou a oferta de crédito as empresas e, com isso, houve aumento do emprego. Além disso, as pessoas passaram a ter acesso a linhas de crédito e consumiram bastante da indústrias brasileiras. Mas, infelizmente, o que vemos atualmente é um governo que a todo momento ataca a Caixa e o Banco do Brasil, promove o fatiamento para facilitar a privatização. Mas a população viu que no momento em que mais precisaram quem pagou o auxilio emergencial, o Bolsa Família e outros programas sociais foi um banco público, no caso a Caixa Econômica", destaca.
Ivone ainda lembra que ao mesmo tempo em que o governo usa os bancos públicos, ele promove desmontes como o que agora ocorre no Banco do Brasil, responsável por financiar 60% da agricultura familiar. "Os bancários foram surpreendidos, recentemente, com a noticia de que haverá reestruturação no BB e, com isso, serão extintos 5 mil postos de trabalho, extinção de caixas, além de fechamento de agências que muitas vezes promovem a bancarização de pequenos municípios. Por isso, estamos juntos com a UNI lutando contra a retirada de direitos e contra o desmonte", comenta.
O diretor regional da UNI Américas, Márcio Monzane, destacou que hoje 85% da América Latina depende de recursos vindos de bancos públicos. E se os bancos públicos não estão presentes em todos os municípios e fortes, é bem provável que ocorra a falência administrativa dessas microrregiões.
"Vemos que numa crise ou em uma pandemia como a de agora, somente os bancos públicos possuem condições de apoiar a sociedade e atender a demanda dela. Vimos que na Colômbia, por exemplo, o governo liberou recursos por meio dos bancos privados, mas ele não chegou nas pequenas empresas. No Chile ocorreu o mesmo e a situação foi grave, quando os trabalhadores foram forçados a usar parte de sua aposentadoria para sobreviver. Enquanto que nos Estados Unidos vimos que Trump preferiu distribuir renda por meio de cheques enviados pelos correios públicos. Ele não usou o sistema privados dos EUA porque achou que os recursos poderiam não chegar aos mais necessitados. E esta é uma lição que fica de que é importante reforçar e manter os bancos públicos, principalmente no Brasil", diz.
Não adianta ter banco forte e governo negacionista
No caso do Uruguai, o presidente da Associação dos Empregados Bancários (AEBU), Elbio Monegal, diz o contrário, que o país tem banco público forte, mas o governo não se interessa em ajudar a sociedade durante a crise.
"O governo se negou a criar um renda extra ou auxílio durante a crise, deixando quem já estava na informalidade desamparado. A renda básica poderia ter sido viabilizada pelo governo, mas ele preferiu aumentar o preço dos combustíveis, as tarifas bancárias, o preço dos alimentos. Também não temos acordo para compra de vacina, joga com a saúde da nossa gente, e somos o país mais atrasado no combate ao coronavírus. Esse é somente alguns exemplos do que tem ocorrido com nós uruguaios", critica.
O mesmo ocorre, por exemplo, na Costa Rica, segundo Roger Muñoz, secretário-geral do Sindicato dos Empregados do Banco da Costa Rica (UNEBANCO), que destaca que apesar de ser um país pequeno, de 5 milhões de habitantes, eles contam com somente dois bancos do Estado.
"Os bancos públicos tiveram papel fundamental nesta pandemia, mas a situação é de incompetência do governo, já que ele limita o trabalho e não permite que os acessos sejam ampliados. Mas, mesmo assim, com todas as dificuldades, o turismo e os pequenos comerciantes recorrem a estes bancos para conseguir seguir adiante com suas atividades, que são as prejudicadas e de difícil recuperação na pós pandemia (...) Os governos usam da crise pandêmica para justificar suas más gestões e retirar direitos, e a classe trabalhadora é a que mais sofre".
No Peru, os bancos não fizeram muito pela população na primeira onda. De acordo com Jorge Peña, secretário-geral da Federação dos Trabalhadores Bancários e Afins (FETBANF), e secretário-geral do Sindicato Unitário dos Trabalhadores do Banco de La Nación (SUTBAN), a emergência sanitária deixa importantes lições: necessidade de que o Estado se cumpra com saúde e recursos financeiros de qualidade sempre que houver necessidade.
"Com muita luta e organização do movimento sindical, o Banco de La Nacion teve papel mais importante ainda nesta segunda onda. Ele chegou a oferecer empréstimos para cidades e em lugares mais afastados e conseguimos com nosso projeto aumentar em 40% a bancarização. Porém, a luta ainda continua, já que o crescimento acelerado do teletrabalho é irreversivel e os bancos usaram disso para retirar direitos trabalhistas".