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Brasil é muito grande para o ‘cercadinho’ da mídia

Linha fina
Primeiro entrevistado do ano no Contraponto, ex-ministro Franklin Martins se diz otimista em relação à democratização da comunicação, afirma que quem apostar contra a Copa vai perder e torce para que os debates de projetos deem o norte para as eleições
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São Paulo – “O Brasil se tornou grande demais para ficar preso no cercadinho do oligopólio da comunicação.” A opinião é do jornalista Franklin Martins, ex-ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social do governo Lula, para quem uma nova regulamentação da comunicação eletrônica do país – rádio, TV, internet – é irreversível. Franklin deu destaque ao tema durante entrevista na segunda 3 ao Contraponto – programa mensal de webtv, parceria entre Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé e Sindicato.

O ex-ministro defende que uma nova legislação para regulamentar o setor é necessária, por representar um serviço de interesse público. “Toda concessão de serviço público (distribuição de água, geração de energia, sistema financeiro, transportes etc.) tem obrigações e a regulamentação para isso existe em todo o mundo, e com as telecomunicações não é diferente. Não tem nada a ver com interferir em conteúdo de jornais e revistas impressas – para isso basta uma legislação de direito de resposta que coíba as calúnias e difamações. Trata-se de assegurar o equilíbrio, a pluralidade, proteger a dignidade do menor, coibir o preconceito e impedir a propriedade cruzada”, afirmou.

Segundo o jornalista, ainda que uma legislação a esse respeito demore, algumas mudanças, na prática, já estão acontecendo. “Estamos assistindo a uma revolução na blogosfera. O velho modelo de jornalismo, com um núcleo produtor e massa passiva, acabou. Hoje mal a notícia sai, está sendo discutida, apoiada, vaiada. A blogosfera é como se fosse o grilo falante do Pinóquio, questionador do poder absoluto.”

Ele destacou afirmação feita ontem pelo ministro da Comunicações, Paulo Bernardo, após o ato de substituição de Helena Chagas por Thomas Traumann na Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República. Referindo-se ao gigantismo da presença de veículos como o Google no meio da informação, do entretenimento e da publicidade, Bernardo afirmou que o Google está se tornando “o grande monopólio” da mídia: “A gente vê uma disputa entre teles e TVs e, provavelmente, se durar muitos anos, o Google vai engolir os dois”. Antes, havia se declarado favorável à regulação da mídia. “Sempre falei isso e sempre defendi. Nós precisamos apenas chegar a um acordo sobre qual vai ser o modelo, qual vai ser a forma de conduzir, se vamos fazer um projeto único ou se vamos fazer por partes”, declarou a jornalistas após o evento.

Franklin, que liderou a preparação de um anteprojeto de marco civil das telecomunicações (a legislação atual tem mais de 50 anos) antes de deixar o governo, em 2010, elogiou a fala de Paulo Bernardo, que vem sendo duramente criticado pelos movimentos de democratização da mídia exatamente por ter engavetado o projeto. O ex-ministro ponderou, entretanto, que a necessidade de regulação não é só para o “monopólio do outro”, mas contra todos os monopólios. “Se deixar o mercado resolver, prevalece a lei do mais forte. O Brasil se tornou grande para ficar no cercadinho do oligopólio da comunicação.”

Quem apostar contra perde - O jornalista defendeu o conceito de “mídia técnica” na condução da política de utilização dos recursos da publicidade estatal, argumentando que essa visão, implementada durante sua gestão (2007-2010), contribuiu para a desconcentração de recursos pagos a grandes veículos. Lembrou que quando entrou no governo havia 400 rádios pelo Brasil com publicidade do governo federal. Quando saiu eram 4 mil. “Com a mídia técnica passou a haver uma correspondência, uma equidade.”

Afirmou ainda que acredita numa rápida aprovação do Marco Civil da Internet, por ser resultado de um amplo processo de negociação entre governo, parlamentares, empresa e sociedade. Para ele, o mundo todo está olhando para o Brasil por conta do pioneirismo desse projeto, que tem a finalidade de assegurar a neutralidade da rede (vetar a venda de pacotes diferenciados por tipo de conteúdo pelos provedores de internet, assemelhando a rede a uma TV a cabo), a liberdade de expressão e a privacidade dos usuários. Além disso, observou, trata-se de um projeto em regime de urgência, ou seja, a pauta do Congresso não anda se não for votado.

Franklin não quis comentar a saída da ministra Helena Chagas da Secom nem seu desempenho à frente da comunicação do governo Dilma. Defendeu tanto a qualidade da ex-ministra quanto a de seu sucessor, Thomas Traumann, e enfatizou ser obrigação de qualquer governo se comunicar com a população. “Governo tem de fazer disputa politica de forma permanente. Lula fazia quase quatro entrevistas por semana. O governo tem de expor sua versão, pois não existe uma imprensa, mas uma infinidade de imprensas. Governo que não faz disputa deixa que alguém faça a mediação entre política e sociedade. O governo da presidenta Dilma, depois das manifestações de junho, começou a fazer disputa política.”

Para ele, entretanto, tentativas de setores da imprensa e da oposição de plantar e explorar fatos negativos e de antecipar o processo sucessório não devem nortear a decisão dos eleitores em outubro. “O que define o voto é o sentimento das pessoas em relação à sua situação e os debates de projetos.”

A propósito do risco de eventuais manifestações ou notícias negativas associadas à realização da Copa do Mundo se voltarem contra o governo, o ex-ministro foi enfático: “Quem apostar contra o Brasil vai se dar mal”. Questionado sobre sua conduta durante as copas de 1970 e 1974, quando estava exilado depois de participar de organizações de resistência armada à ditadura, então em seu momento mais crítico, o jornalista afirmou ter torcido pela seleção brasileira. “Ainda que causasse alguns rachas internos, não dava para torcer contra o Brasil.”

Participaram desta primeira edição do ano do programa Contraponto, mediado pela presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, Maria Inês Nassif, do portal Carta Maior, Paulo Donizetti de Souza, da Rede Brasil Atual, e Rodrigo Vianna, do Escrevinhador.

A íntegra do programa está disponível no site ou no canal do YouTube do Sindicato.


Rede Brasil Atual - 4/2/2014

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