São Paulo – Apesar das reiteradas afirmações de que não realizaria nenhuma intervenção sem dialogar com os ciclistas, a gestão do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), apagou na quarta 22 uma ciclovia de aproximadamente um quilômetro, no trajeto da rua Dr. Fausto de Almeida Prado Penteado com Av. Amarilis, no Morumbi, zona oeste da cidade. Segundo Daniel Guth, diretor da ONG Ciclocidade, a ação foi justificada pela prefeitura como obra de tapa-buraco, apesar de os ciclistas da região afirmarem que o trecho estava em perfeitas condições de utilização.
Tudo que identificava a via para ciclistas foi removido: a pintura vermelha, os tachões do chão, as placas de sinalização. Os mil metros de via foram totalmente cobertos com pavimento novo. “É uma situação gravíssima, porque deixou os ciclistas que transitam no local sem segurança. Na quinta 23 os veículos já transitam ocupando o que era a ciclovia”, disse Guth. A prefeitura regional do Butantã não respondeu os questionamentos da Rede Brasil Atual.
Para Guth, se se tratasse de tapa-buraco não haveria necessidade de cobrir um quilômetro de via e remover tudo que se relacionava com a ciclovia. “Não faz sentido a obra e o gasto de dinheiro público para uma ação de tapa-buraco no local. Não havia demanda. E, na verdade, foi uma obra de recapeamento, não foi intervenção pontual”, ressaltou.
No sistema da operação Tapa Buraco, o processo da obra deve apresentar a foto do antes e depois dos trabalhos. Em nenhuma imagem aparece qualquer buraco que demandasse obra de tal complexidade. A via para ciclistas aparece apenas fresada, que é uma etapa anterior ao processo de recapeamento, realizada pelo maquinário da própria equipe de manutenção.
O diretor da Ciclocidade vê nessa intervenção a confirmação de uma preocupação externada há poucos dias, quando a RBA noticiou que Doria havia excluído os ciclistas da revisão do Plano Cicloviário da capital paulista. “Infelizmente, essa é uma demonstração de que a gestão não vai dialogar com os ciclistas. O secretário [dos tranaportes, Sérgio Avelleda] disse várias vezes que não iam intervir sem consultar os ciclistas, mas não é o que está acontecendo”, lamentou.
A Ciclocidade soltou nota na noite de quarta 22 cobrando posicionamento da gestão Doria. “Chega de falsos diálogos e etéreas promessas”, diz um trecho do documento.
Para Guth, também chama atenção que a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) não tenha participado do processo. “Segundo o Código de Trânsito de Brasileiro (CTB), somente o órgão de trânsito pode remover sinalização viária. E a CET nos informou que não estava ciente do que estava sendo feito no Morumbi. Depois foi dito que as placas foram removidas para limpeza, pois estavam pichadas. Mas temos vídeos de usuários da via que comprovam que não havia problemas com as placas”, afirmou.
Para Rafael Calabria, pesquisador em mobilidade urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), houve uma violação da Política Nacional de Mobilidade Urbana. ”Retroceder na política cicloviária sem aviso ou comunicação é uma violação grave da Política Nacional, tanto das diretrizes e princípios de prioridade e segurança aos modos ativos, quanto do direito dos usuários dos sistemas de mobilidade à participação no planejamento, fiscalização e avaliação das Políticas públicas implantadas. No âmbito municipal, também contraria o Plano de Mobilidade Urbana e o próprio Plano Diretor, que foram feitos seguindo diretrizes da Política Nacional”, afirmou.