Bancárias de todo o país contarão com um canal de atendimento a vítimas de violência. O acordo foi assinado na tarde desta quarta-feira 11 pelo Comando Nacional dos Bancários e Fenaban (Federação Nacional dos Bancos). A partir de agora, os bancos terão 30 dias para a implementação do canal, que prevê orientação para gestores e demais empregados, acolhimento às vítimas, por equipe devidamente orientada para este fim, e medidas protetivas.
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Dentre as medidas que poderão ser adotadas pelos bancos estão a transferência da trabalhadora, com garantia de sigilo sobre o local de destino; a flexibilização de seu horário de trabalho, para protegê-la do agressor; a concessão de linha de crédito especial às vítimas. Também é assegurada à bancária a confidencialidade, se necessário, sobre a denúncia.
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Ficou acertado ainda que os sindicatos acompanharão a atuação dos canais por meio da mesa temática de igualdade de oportunidades.
O canal de apoio é uma reivindicação da categoria, que vem sendo negociada com os bancos desde março de 2019, tendo sido acatada pela Fenaban em reunião com o Comando no último dia 19 de fevereiro.
“Mais uma vez fica evidente que só a organização dos trabalhadores em seus sindicatos resulta em direitos e avanços. Fica claro também que sindicatos não lutam apenas por aumentos salariais, mas também por cidadania e por uma sociedade mais justa. Com a criação deste canal, mais uma vez a categoria bancária sai à frente e demonstra sua força e seu pioneirismo. Esse acordo será um marco para as demais categorias profissionais”, destaca a presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, Ivone Silva, uma das coordenadoras do Comando Nacional dos Bancários.
Ivone ressalta ainda a importância de um atendimento como esse, principalmente em um país que carrega a triste realidade de ser o 5º lugar no ranking mundial de feminicídio, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). Outros levantamentos confirmam esse quadro brutal: segundo o Atlas da Violência de 2019, produzido pelo Ipea e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 13 mulheres são assassinadas por dia no Brasil, ou seja, uma a cada duas horas. Estudos mostram ainda que 85% dos casos de violência contra a mulher ocorrem dentro de casa.
“Metade da categoria bancária é de mulheres, e elas também são vítimas dessa cultura machista e de violência. Algumas denúncias inclusive chegam ao Sindicato. Mas hoje, infelizmente, a maioria das mulheres que passam por esse grande sofrimento sente vergonha. Com o canal de atendimento elas poderão ter o apoio que precisam no local de trabalho”, diz Ivone.
A dirigente destaca também que o problema acaba resultando na demissão dessas trabalhadoras, já que traz consequências na sua produtividade. “O que nós queremos com esse canal é que elas possam denunciar a situação que estão vivendo e se sentirem acolhidas, compreendidas e protegidas no ambiente de trabalho.”
Ivone lembra ainda que o Sindicato foi pioneiro no tema ao lançar, em 2019, um serviço de atendimento jurídico a mulheres vítimas de violência, o “Basta, Não Irão Nos Calar!”.
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A presidenta da Contraf-CUT, Juvandia Moreira, também coordenadora do Comando dos Bancários, salientou outro aspecto importante do acordo. “O documento também é uma declaração de repúdio à violência contra a mulher. E é importante que os bancos assinem essa declaração e se comprometam com o combate a essas estatísticas”, afirma.
O diretor de Políticas de Relações Trabalhistas e Sindicais da Fenaban, Adauto Duarte, também celebrou a importância do acordo. “Diante da violência doméstica, a bancária reage de duas formas: ela tem vergonha e também tem medo da reação do empregador. E quando o Comando trouxe para mesa de negociação que essa estatística que está na televisão pode estar do nosso lado, isso nos aproximou do problema e nos tornamos parte em seu combate”, disse ele, elogiando a habilidade do Comando, pela primeira vez coordenado por duas mulheres, na condução da negociação sobre o canal.
Cerimônia
A assinatura do acordo foi precedida de palestra da qual participou a ativista LGBT Rita Von Hunty (foto ao lado). Rita comparou os dados do coronavírus com as estatísticas de feminicídio no Brasil. “A OMS acabou de decretar uma pandemia de coronavírus no mundo. No Brasil, em 2017, houve 3.739 assassinatos de mulheres motivadas por crimes passionais, ou seja, mais de 10 por dia ao ano. Nenhum país está registrando 10 mortes ao dia por coronavírus, mas ele está o tempo todo na mídia. Por que então o feminicídio não está na mídia da mesma forma alarmante?”, questionou.
Rita Von Hunty também destacou que os papéis de homem e mulher são ditados pela sociedade, e que os homens também podem ser vítimas dessa construção social, que os associa a duros, corajosos, provedores. “A masculinidade tóxica também faz do homem uma vítima.”
Outra palestrante foi a economista Adriana Carvalho, que atua na ONU Mulheres. Ela falou sobre como a violência doméstica impacta na produtividade da vítima, com absenteísmo inclusive, e até mesmo na do agressor. “Precisamos entender melhor esses efeitos, mas com certeza eles existem. Então empresas que lidam com isso também estão lidando com sua produtividade. Essa é uma questão social, mas também uma questão de desenvolvimento e econômica”, afirmou.