São Paulo – Desumana e indigna. Esses foram alguns dos adjetivos usados por representantes de associações de juízes federais e integrantes do Ministério Público para classificar a reforma da Previdência do governo Temer. Eles foram ouvidos em audiência pública da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Previdência na segunda-feira 5. Foi a oitava audiência da CPI.
Antonio Rodrigues da Silva, presidente da Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais (Anprev), ressaltou que além de não conter nenhum novo benefício aos contribuintes, a reforma ataca os três fundamentos para sua concessão: a idade mínima, que é aumentada, o tempo de contribuição, que é ampliado, e o valor do benefício, que é diminuído.
Ele destacou pontos que considera ainda mais prejudiciais, como a redução do acesso ao benefício de prestação continuada para o idoso e a ampliação do tempo mínimo de contribuição para ter direito ao benefício previdenciário: de 15 para 25 anos. O representante da Anprev citou dados do INSS segundo os quais, com o novo prazo de carência em vigor, apenas 24% dos atuais aposentados por idade estariam em gozo de benefício e 76% não teriam conseguido comprovar os 25 anos de carência.
“A PEC 287 tem por objetivo privatizar a previdência pública. Ela está sendo feita para atender aos desejos dos bancos e seguradoras privadas. Não tem qualquer preocupação de natureza social”, protestou.
Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Jayme Martins de Oliveira Neto afirmou que a reforma, que ainda tramita na Câmara, destrói os princípios sociais da Constituição e negou que seja fundamental para a sobrevivência econômica do país.
“É uma reforma em que se procura estabelecer uma guerra sistemática entre números desconsiderando que atrás deles existe um povo, o povo brasileiro”, lamentou.
Crimes contra a Previdência – Representando a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Antônio José de Carvalho Araújo ressaltou que o governo foca no déficit de R$ 151,9 bilhões em 2016, mas não leva em consideração os crimes diversos contra a Previdência.
De acordo com ele, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional estima que o Brasil deixe de arrecadar cerca de R$ 500 bilhões ao ano em tributos devido à sonegação fiscal, principalmente das grandes empresas.
O representante da Ajufe ressaltou que a dívida ativa da União já alcança mais de R$ 1,8 trilhão, dos quais mais de R$ 400 bilhões são relativas à Previdência. O valor, ressaltou, é quase três vezes superior ao “déficit”. Ele disse ainda que cerca de 1% dos devedores de tributos são responsáveis por 70% do estoque da dívida previdenciária e fiscal. Ainda segundo Araújo, 42% das dívidas de contribuições previdenciárias que o governo tem cobrado tem entre média e alta recuperabilidade.
Devedores contumazes – Ele destacou ainda que muitos desses devedores da Previdência são contumazes. E pediu punições severas. Conforme explicou, o devedor contumaz, diferente do devedor eventual, é aquele cidadão ou empresa que, mesmo em uma crise econômica, têm condições de pagar suas tributações, mas não pagam.
“Não pagam porque se aproveitam de uma prática desleal, não pagando a tributação, esperando uma benesse do governo, que são os planos de recuperação fiscal, muitos deles oriundos desde o ano 2000 e intensificados. Eles se aproveitam e fazem disso uma atividade econômica estratégica de sua atividade”, argumentou, defendendo a cassação da permissão para atividades empresariais do devedor contumaz.
Auditoria – Os debatedores defenderam uma auditoria nas contas da Previdência e melhoria na fiscalização. Segundo eles, a reforma da Previdência não pode avançar sem que as contas sejam abertas e que os números sejam mostrados e auditados.
Entre as medidas para a existência de uma previdência pública, de caráter solidário, Antonio Rodrigues da Silva destacou o combate à sonegação fiscal e a exigência das autoridades competentes responsáveis pela gestão, no âmbito da Secretaria da Receita Federal e da Procuradoria da Fazenda, a efetiva cobrança das dívidas ativas, “que estão paralisadas e, via de consequência, sendo alcançadas pelo instituto da prescrição”.
Paulo Penteado Teixeira, representante da Associação Paulista do Ministério Público (APMP) afirmou que, quando se fala em déficit, não é uma questão de Previdência, mas de gestão.
“O caminho aqui não é cortar benefício social. É abrir novas possibilidades de se recuperar esse dinheiro perdido”, afirmou o juiz Guilherme Guimarães Feliciano, da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra).