Após quatro anos de batalha judicial e mobilização sindical, os 37 metroviários demitidos após a greve realizada às vésperas da Copa do Mundo de 2014 retomaram seus empregos na Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô). O juiz Thiago Melosi Sória, da 34ª Vara do Trabalho da 2ª Região, homologou no dia 14 acordo entre o Sindicato dos Metroviários e a estatal, consolidando uma vitória dos trabalhadores e expondo a ilegalidade das demissões praticadas pelo Metrô. O prazo para que os trabalhadores retomassem seus postos era de cinco dias a contar da data do acordo. A reportagem é da RBA.
“É uma vitória importantíssima. Esse acordo foi viabilizado na campanha salarial do ano passado. O (ex-governador Geraldo) Alckmin não aceitava. Mas no 1º dia útil após a saída dele, o atual governador Márcio França autorizou a companhia a fechar o acordo”, contou o coordenador do sindicato, Wagner Fajardo. “Isso mostra que a luta vale a pena. A categoria aceitou uma mensalidade maior para ajudar financeiramente os demitidos e eles tiveram o apoio necessário para resistir nesses quatro anos. Foram muitas mobilizações e campanhas pela reintegração. A união dos metroviários foi fundamental”, completou.
Além do retorno ao trabalho, o acordo prevê o pagamento por todo o período de afastamento, estabilidade no emprego por 12 meses e o reconhecimento, pelo Metrô, de que os metroviários não cometeram nenhum ilícito criminal por ocasião da greve em todos os processos criminais abertos. A petição totaliza aproximadamente R$ 14 milhões e deverá ser quitada em 12 parcelas.
O valor considera todo o período de afastamento até o último dia 2 de maio, e as diferenças devidas até a efetiva reintegração deverão ser pagas em folha de pagamento. Os trabalhadores concederam um desconto de 18,% do total devido pela companhia. Em caso de descumprimento do acordo, o Metrô pagará multa de 20%.
As dispensas por justa causa foram consideradas nulas pelo TRT, que considerou ter havido exercício regular do direito de greve. O juízo de primeiro grau (Vara) havia decidido pela reintegração imediata já em 2014 e o de segunda instância (TRT), em 2016.
História
Em 10 de junho de 2014, o Metrô demitiu 42 funcionários, todos com alguma função na organização da greve – delegados sindicais, diretores e até um membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa), em resposta à greve realizada entre os dias 4 e 9. O então governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), chegou a declarar que tinha uma lista de outros funcionários que seriam dispensados caso o movimento continuasse. Todos receberam telegramas comunicando suas demissões, com descrição dos locais e horários onde teriam cometido faltas graves.
No entanto, como a RBA demonstrou em julho daquele ano, documentos do Metrô enviados ao Ministério Público, obtidos com exclusividade pela reportagem, revelavam inconsistências nas motivações alegadas pela direção da empresa ao demitir por justa causa os metroviários. As evidências reforçavam a tese de que houve perseguição política aos grevistas. A companhia acusava funcionários de ter cometido depredações que não constavam da lista oficial dos patrimônios supostamente danificados durante as ações de greve.
Dois funcionários reintegrados ao Metrô pouco depois da demissão tinham sido acusados com alto nível de detalhamento. Um deles teria invadido a estação Ana Rosa, que interliga as linhas 1-Azul e 2-Verde, “danificando as fechaduras” e “impedindo a entrada de funcionários” em 6 de junho, às 6h15. Outro teria impedido o fechamento da porta do trem G-24 na estação Santa Cecília, na Linha 3-Vermelha, às 7h15 do dia 7 de junho. Mas o Metrô não foi capaz de comprovar a acusação. Mais dois foram reintegrados por ter mandato sindical.
Além disso, a companhia responsabilizou os metroviários por danos causados durante uma revolta de usuários da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), em Itaquera, na zona leste. E acusou os trabalhadores de ter danificado locais onde não houve qualquer ação de greve naqueles dias. Em outro caso, a empresa atribuiu a 18 trabalhadores a ação de impedir ou obstruir “fechamento da porta do trem (composição H-58), interrompendo a circulação dos trens”. Todos eles teriam incorrido no delito às 20h15, do dia 5 de junho, na estação Tatuapé, na Linha 3-Vermelha. Outra acusação não comprovada.
Durante a batalha judicial, os trabalhadores demitidos foram apoiados pela categoria, que aprovou em assembleia o aumento da contribuição mensal de 1,3% para 1,9% do salário, com o objetivo de repassar o excedente aos demitidos em consequência da greve um valor próximo do salário-base dos metroviários. Eles assumiram o compromisso de repor os valores. Além disso, participaram de todas as assembleias e atos em defesa da reintegração.
Perseguição
Já com a ação tramitando na Justiça, a Superintendência Regional do Trabalho autuou o Metrô por atitude antissindical, pela demissão de 42 grevistas, todos dirigentes ou delegados sindicais. "O ato terminativo dos 42 contratos de trabalho por justa causa dos empregados acabou, assim, aparentando uma medida de caráter persecutório que possui o condão da vingança ou perseguição à categoria, incabíveis neste momento de conflito", dizia o texto da autuação.
Já na primeira instância, ficou evidenciada a forma precipitada e ilegal com que o Metrô agiu nas demissões. “A empregadora violou o disposto na cláusula 26ª da Convenção Coletiva de Trabalho, pois deixou de descrever os atos praticados por cada empregado. O 'mau procedimento' – qualificação dada às condutas dos dispensados – é conceito legal de abrangência amplíssima, no qual podem ser inseridos os mais variados tipos de atos, o que torna ainda mais evidente a inadequação formal do ato de dispensa”, explicou o juiz da 34ª Vara, Thiago Melosi Sória.
A situação não foi diferente na segunda instância. E também na terceira. No entanto, as decisões sempre protelavam a reintegração, argumentando que ela só poderia ocorrer com o trânsito em julgado da ação. “Com isso o Metrô foi interpondo recursos e mais recursos, mesmo sabendo que a causa estava perdida, apenas para protelar a reintegração”, afirmou Cordeiro. Com o acordo, a ação judicial deve ser extinta.