Na última quarta 12, em Genebra, na Suíça, no âmbito da 112ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho (OIT), foi realizada a primeira reunião tripartite setorial do evento, que reuniu o setor bancário e teve como tema "As tecnologias disruptivas como a IA e o futuro do trabalho dialogado, legislado e julgado".
As entidades sindicais bancárias brasileiras foram representadas pela presidenta do Sindicato, Neiva Ribeiro, pela presidenta da Contraf-CUT, Juvandia Moreira – as duas coordenadoras do Comando Nacional dos Bancários – e pela secretária de Relações Internacionais da Contraf-CUT, Rita Berlofa.
A presidenta do Sindicato, Neiva Ribeiro, destacou na sua intervenção a preocupação do movimento sindical com a redução dos postos de trabalho decorrente do uso da inteligência artificial, além da questão da segurança dos dados e do uso da tecnologia para golpes e fraudes.
"O uso intensivo da IA faz com que compartilhemos dados de voz e imagens, assinaturas nossas, que são armazenados em bancos de dados que estão fora do nosso controle", destacou a presidenta do Sindicato. "Com o aumento da tecnologia no sistema financeiro o que estamos assistindo, também, é a transferência de riscos do negócio para os clientes. Precisamos ter uma regulamentação que traga ganhos e segurança para trabalhadores, empregadores e governos", completou.
Durante a sua exposição na reunião, o ministro do Trabalho e Emprego do Brasil, Luiz Marinho, destacou a necessidade de valorização da negociação coletiva, lembrando que sem o diálogo entre todos os setores não será possível encontrar soluções para a redução de empregos. O ministro citou dados de estudo do FMI (Fundo Monetário Internacional) sobre o tema. "O levantamento mostra que o aumento do uso da Inteligência Artificial afetará 40% dos empregos em todo o mundo, o que poderá aprofundar ainda mais as desigualdades sociais.”
Por sua vez, a presidenta da Contraf-CUT, Juvandia Moreira, avalia que o evento foi importante para que sejam pensadas estratégias que possibilitem que o avanço da tecnologia não acarrete no aprofundamento das desigualdades sociais. "Entre as conclusões que tivemos está a de que precisamos aprofundar estudos para pensar uma política que seja mais realista , que não destrua os empregos, e gere uma transição justa. E todos nós, representantes dos trabalhadores, empregadores e do governo, chegamos à conclusão que tem que haver diálogo."
Bancários brasileiros na vanguarda
Neste sentido, o movimento sindical bancário brasileiro está na vanguarda do debate dos impactos de tecnologias como a inteligência artificial no mundo do trabalho e na sociedade como um todo. Um dos eixos da Campanha Nacional Unificada dos Bancários 2024 é justamente a “Defesa dos empregos, impactos dos avanços tecnológicos no trabalho bancário”.
E, durante a 26ª Conferência Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro, realizada entre os dias 7 e 9 de junho, que aprovou a minuta de reivindicações da categoria, bancários de todo o país participaram da mesa de debates “A inteligência artificial e seus impactos na vida e nos empregos”, que contou com uma apresentação do doutor em Ciências Políticas da USP (Universidade de São Paulo) e professor da UFABC (Universidade Federal do ABC), Sérgio Amadeu.
O professor, além de abordar o impacto da inteligência artificial no mundo do trabalho e o papel do movimento sindical na defesa dos empregos e direitos neste cenário, discorreu também sobre questões como a segurança dos dados e o que ele denomina como neocolonialismo digital, conceito traduzido na concentração da infraestrutura de armazenamento de dados e o desenvolvimento de modelos de aprendizado de máquinas em poucas potências mundiais, enquanto o restante dos países está reduzido a um papel de meros fornecedores de dados e usuários da tecnologia.
Lula
Na quinta-feira 13, dando continuidade a 112ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, o evento contou com a participação do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
O presidente brasileiro, no seu discurso, pontuou preocupações alinhadas com os debates promovidos pelo movimento sindical bancário sobre a inteligência artificial, impactos no mundo do trabalho e segurança dos dados. “A inteligência artificial transformará radicalmente nosso modo de vida. Teremos que atuar para que seus benefícios cheguem a todos e não apenas aos mesmos países que sempre ficam com a parte melhor. Do contrário, tenderá a reforçar vieses e hierarquias geopolíticas, culturais, sociais e de gênero”, disse Lula.
“O poder computacional necessário para mover suas engrenagens é desigualmente distribuído. Seu insumo essencial são nossos dados, nossa atenção e nosso tempo, e é disputado ferozmente por um punhado de empresas. Nenhum país é capaz de resolver sozinho os dilemas que afetam toda a sociedade internacional. Precisamos buscar as melhores experiências onde quer que elas estejam para que a gente possa colocar em prática no mundo inteiro”, acrescentou.
O presidente brasileiro reforçou a necessidade do desenvolvimento de modelos de aprendizagem de máquinas no Sul global, mesma preocupação manifestada pelo professor Sérgio Amadeu na 26ª Conferência Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro.
“A OIT tem obrigação de trabalhar junto com a ONU e com os países pra que a gente construa um projeto de Inteligência Artificial que seja do Sul global, pra que a gente possa competir com os países mais ricos, que ao criar a IA, tentam manipular o restante da humanidade. A IA nada mais é do que a esperteza de algumas empresas que acumulam dados de todos os seres humanos e, sem pagar um centavo de dólar pro povo, conseguem fazer o que estão fazendo hoje. É uma tarefa revolucionária a gente tentar mudar esse quadro”, enfatizou Lula.
Lula também abordou outros temas alinhados com os debates e bandeiras de luta do movimento sindical bancário brasileiro como, por exemplo, o combate à fome e às desigualdades sociais; salário igual para igual função; impactos da mudança climática; trabalho decente para todos; e a taxação dos super-ricos.
“O Brasil está impulsionando a proposta de taxação dos super-ricos nos debates do G-20. Nunca antes o mundo teve tantos bilionários. Estamos falando de 3 mil pessoas que detêm quase US$ 15 trilhões em patrimônio. Isso representa a soma dos PIBs do Japão, da Alemanha, da Índia e do Reino Unido. É mais do que se estima ser necessário para os países em desenvolvimento lidarem com a mudança climática. A concentração de renda é tão absurda que alguns indivíduos possuem seus próprios programas espaciais. Não precisamos buscar soluções em Marte. É a Terra que precisa do nosso cuidado”, avaliou o presidente brasileiro.