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São Paulo - Há 22 anos, oito rapazes foram brutalmente assassinados em frente à Igreja da Candelária, no centro do Rio de Janeiro. A Chacina da Candelária, como ficou conhecido o episódio, é um ícone da violência contra jovens negros e pobres no Brasil, e foi lembrada na manhã de quinta 23 com missa e ato inter-religioso no local. À tarde, ativistas de direitos humanos participaram da Caminhada em Defesa da Vida, partindo da igreja em direção à Cinelândia (fotos).

Irmã de um dos sobreviventes, Patrícia de Oliveira lamentou que uma tragédia ocorrida há mais de duas décadas continue destruindo famílias inteiras. Segundo ela, a sociedade acha que tem que matar adolescente, como se antecedente criminal justificasse a morte. "Por isso, continuamos a fazer as atividades, e essa caminhada hoje é contra a redução da maioridade penal”, afirmou.
Após sobreviver aos quatro tiros que levou na noite da chacina, Wagner dos Santos, irmão de Patrícia de Oliveira, voltou a sofrer atentado em setembro de 1994, com mais quatro tiros. Ele sobreviveu, mas ficou cego de um olho e com várias sequelas. O Ministério Público então o colocou no Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas. Graças a ele, quatro dos assassinos foram reconhecidos. Hoje o rapaz vive na Suíça.
Fundadora e coordenadora do Movimento Moleque – Mães pelos Direitos dos Adolescentes no Sistema Socioeducativo, Mônica Cunha perdeu um dos filhos, Rafael, aos 20 anos, morto por um policial em 2006.
Para ela, as inúmeras passagens de menores infratores pela polícia devem-se, principalmente, à não implementação das medidas socioeducativas. “O Estado legaliza a morte dessas crianças. Ninguém nasce bandido. Torna-se autor de ato infracional pelas condições de vida, por falta de direitos que o Estado não dá para a família, sem creche, sem casa, sem um trabalho decente”, afirmou Mônica, ao destacar o papel da mídia e da sociedade, que estimulam o consumo para uma maioria empobrecida.

Pepe Vargas também voltou a se colocar contra a redução da maioridade penal dizendo que é um retrocesso sob o ponto de vista dos direitos e garantias individuais e para a sociedade, pois em vez de diminuir, agravará a violência. “Precisamos construir uma cultura de direitos humanos e de respeito à integridade da pessoa humana, porque, infelizmente, isso ainda não aconteceu.”
Três candelárias por dia - O Brasil registrou 10.136 assassinatos de jovens entre 11 e 19 anos em 2013, em média 28 mortos por dia, o que equivale a 3,5 chacinas da Candelária perpetradas diariamente, de acordo com o sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz, autor do estudo Mapa da Violência e coordenador da Área de Estudos sobre Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso).
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Waiselfisz falou na abertura da audiência pública Jovens Vítimas da Violência e Justiça Reparadora para os Familiares, realizada na sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio. Segundo ele, o perfil das vítimas jovens que sofrem violência é de cor negra, pobre e pouco escolarizado e os índices vêm aumentando a cada ano.

De acordo com os dados nacionais apresentados, o índice de jovens negros, entre 16 e 17 anos, mortos no ano de 2013, é de 66,3 por 100 mil habitantes. O de jovens brancos, na mesma faixa etária, é de 24,2 por 100 mil.
Quanto à escolaridade, 82% das vítimas tinham o nível fundamental. Na faixa etária de 16 e 17 anos, 93% dos mortos são homens.
Flávia Villela e Vladimir Platonow, da Agência Brasil, e Tâmara Freire, da Rádio Nacional, com edição da Redação - 24/7/2015
