A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura irregularidades nos contratos de gestão das Organizações Sociais de Saúde (OSS) com as secretarias de Saúde estadual e municipais em São Paulo um relatório final pífio, do qual ainda acabou retirada qualquer possibilidade de se responsabilizar agentes públicos pela falta de fiscalização ou por ações consideradas irregulares.
A reportagem é da Rede Brasil Atual.
A sessão se estendeu das 11h às 18h, do dia 12, e só foi concluída após um acordo entre os aliados do ex-governador e candidato à Presidência da República Geraldo Alckmin (PSDB), e do atual governador e candidato à reeleição Márcio França (PSB), para evitar constrangimentos a ambos.
O principal impasse era uma representação direcionada a França por conta da indicação de Antonio Rugolo Júnior ao cargo de secretário adjunto estadual da Saúde. Antes de assumir a função, ele presidia a OSS Fundação para o Desenvolvimento Médico e Hospitalar (Famesp), da qual apenas se licenciou até 31 de dezembro deste ano.
“O que deixamos claro é que é incompatível a atuação dele como secretário e a licença da presidência da OSS que ele administrava. É preciso saber quem é o responsável pela nomeação dele, já que a procuradoria-geral do Estado diz não ter sido consultada sobre essa legalidade”, explicou o deputado Carlos Neder (PT).
Na secretaria, Rugolo é responsável justamente pela fiscalização das OSS. Em depoimento à CPI, compareceu com um advogado da entidade. E já assinou um decreto que cede à Famesp o imóvel onde está instalada a maternidade Santa Isabel, em Bauru. Membro do PSB na comissão, o ex-tucano Barros Munhoz pressionou pela retirada da representação. O próprio Rugolo seria alvo de uma representação no mesmo sentido. Mas foi costurado um acordo para que ele seja oficiado a pedir demissão da Famesp ou renunciar ao cargo de secretário adjunto.
Outro ponto que a CPI parecia caminhar para mudar seria o pagamento de uma taxa de administração pela gestão realizada pelas OSS. Essa taxa varia, mas fica em torno de 5% a 15% do total do contrato. A cobrança é considerada irregular pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) de São Paulo, por se configurar em um pagamento à organização.
“Com isso se gera uma remuneração indireta da OSS, quando ela é uma entidade do terceiro setor que não pode ter lucro", disse o presidente do TCE, Renato Martins, em depoimento aos parlamentares.
Com esse valor, por exemplo, dirigentes da Santa Casa de Misericórdia de Bariri esperavam salvar a unidade beneficente privada, atolada em dívidas, com recursos públicos, conforme revelou à CPI o provedor da OSS Irmandade Santa Casa de Bariri, Maurício Rodrigues. Há ainda suspeitas de desvio desse valor para fins variados. No entanto, em vez de vedar a prática, o relatório final da CPI, escrito pelo deputado Cássio Navarro (PSDB), recomenda sua legalização.
O relatório final determinou que sejam tornados públicos o número de profissionais, as cargas horárias e plantões realizados pelas equipes. Os contratos atuais permitem a contratação sem que sejam definidos esses critérios. Com isso, há contratos que estipulam “equipes suficientes”, o que abre margem para descumprimentos de metas e pagamentos irregulares. No entanto, o documento não determina a definição de valores padrão a serem pagos pelas funções, situação em que foi notada a discrepância entre valores destinados às organizações.
A CPI também propôs a proibição, por meio de decreto, da contratação de empresas que tenham servidores públicos como sócios para prestação de serviços às OSS. Durante os trabalhos foram detectados vários casos, sendo o mais emblemático o da empresa SAM Clínica Médica, que tinha o médico Michel Fukusato como sócio. Ele pediu exoneração do cargo. No entanto, a comissão não propôs a vedação das contratações de outras empresas para prestação de serviço às OSS – chamada de quarteirização – mas limitou a prática a 50% dos empregados.
O documento, inclusive, cita a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que liberou a terceirização de todas as atividades das empresas para justificar a decisão. “Vamos deixar claro que a quarteirização, ou terceirização para quem prefere, é sim permitida. Inclusive, recentemente o assunto terceirização da atividade fim foi objeto de recente debate na Suprema Corte que decidiu por sua legalidade. Não se pretende, portanto, com os apontamentos aqui lançados impedir a celebração desses ajustes, mas garantir que sejam tratados com a lisura e transparência que o caso requer”, diz o documento.
Por fim, a CPI recomenda que a secretaria de estado da Saúde adote medidas para auditar, regular e fiscalizar as organizações sociais, o que hoje não ocorre, pois o poder público entende que essas medidas cabem ao TCE. A proposta também deve constar do projeto de lei a ser proposta pela comissão. O documento, no entanto, ainda deve passar por ajustes. “É preciso cuidado na apresentação do projeto de lei para não dar cobertura a ilícitos e problemas que já são conhecidos. É preciso evitar que os problemas conhecidos nesses 20 anos de legislação continuem ocorrendo”, ressaltou Neder.
A comissão foi presidida pelo deputado Edmir Chedid (DEM) e teve como membros, além de Munhoz, Navarro e Neder: Marco Vinholi (PSDB), Cezinha de Madureira (PSD), Roberto de Moraes (PPS) e Jorge Caruso (MDB). Este último não compareceu a nenhuma reunião.