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Lea Vidigal: ataques de Bolsonaro ao BNDES são irresponsáveis

Linha fina
Professora de Direito, autora do livro "BNDES – Um estudo de Direito Econômico", defende o banco público de financiamento e diz que é preciso recuperar a capacidade de planejamento do Estado
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Foto: Agência Brasil

A advogada Lea Vidigal, autora do livro BNDES – Um Estudo de Direito Econômico (Editora LiberArs), afirma que o presidente Jair Bolsonaro é irresponsável ao alardear, sem apresentar provas, que houve escândalos de corrupção envolvendo o banco público. Além de atacar a reputação da instituição, as declarações do presidente contaminam o “ativo” mais importante, que é o conjunto dos funcionários, que formam um corpo técnico bem preparado, historicamente eficiente, e em plenas condições de ajudar o Brasil a melhorar suas condições econômicas e sociais, com tem feito por mais de seis décadas.

A reportagem é da Rede Brasil Atual.

Na obra, que será lançada em São Paulo, Lea estudou a atuação do banco, desde a sua fundação, em 1952, até os dias de hoje, e diz não ter encontrado em toda a sua história indícios de má utilização de recursos públicos. “Tem que primeiro comprovar que existiu alguma coisa, antes de sair falando que existe uma ‘caixa-preta’. Não vi provas contundentes sobre casos de corrupção, muito menos da dimensão alardeada. Em princípio, o BNDES segue sendo uma instituição extremamente eficiente e idônea”, afirma Lea, professora de Direito Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, na terça-feira 17.

A advogada lembra que os países desenvolvidos “sistemática e continuamente” usam instrumentos do Estado para organizar os mercados e desenvolver as suas indústrias a cada nova avanço tecnológico importante. Hoje, segundo a pesquisadora, o BNDES conta com uma carteira de investimentos de pouco mais de US$ 200 bilhões. Na Alemanha, o banco de investimentos estatal tem ativos da ordem de US$ 500 bilhões. Apenas um dos bancos de desenvolvimento chinês acumula quase dois trilhões de dólares em ativos. Segundo a professora, nas últimas décadas o Estado brasileiro passou a atuar de forma tímida na organização da economia.

Histórico

Segundo Lea, doutoranda da Universidade de São Paulo (USP), o estudo aprofundado do histórico de atuação do BNDES é uma tentativa de resgatar e recuperar a missão original do banco.  Criado durante o segundo governo Vargas, surgiu como um resultado de um esforço do Estado de planejar o desenvolvimento econômico do país, contribuindo com investimentos que foram cruciais para criar as bases de infraestrutura, energia e transporte necessárias para a ampliação do processo de industrialização no Brasil.

Com Juscelino Kubitschek (1956-1961), o BNDES teve importante papel na elaboração de diagnósticos que norteariam a atuação do chamado Plano de Metas, que tinha a ambição de promover o desenvolvimento acelerado do país, com financiamento para a indústria de bens de consumo duráveis. “Foi uma associação exitosa entre planejamento e desenvolvimento com democracia. A gente tinha 8% de crescimento do PIB, com um acrescimento de capacidade industrial muito forte”, afirmou.

Desenvolvimento autoritário

Durante a ditadura, o banco continuou a exercer a função de planejamento, mas então abriu mão da atuação em setores estratégicos, delegados ao capital privado nacional e estrangeiro, com foco no financiamento voltado para empresas que atendiam às demandas de uma classe média alta. “O BNDES continuou como central no processo de financiamento do processo de industrialização, inclusive no período militar, mas de uma maneira autoritária, dependente e concentradora de renda, diferentemente do período anterior ao golpe de 1964.” A partir dos choques do petróleo, que levaram à crise da década de 1970, o Estado perdeu a capacidade de estruturar o planejamento.

Privatizações

Na década de 1990, em especial durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), a atuação do BNDES foi restringida, atuando como “gestor” do processo de privatizações, segundo Lea. “Várias estatais foram financiadas ‘a preço de banana’ e financiadas pelo BNDES, às vezes com títulos desvalorizados. O banco perdeu a eficácia como executor, planejador e financiador do desenvolvimento. A gente perdeu a visão de longo prazo.” Ela cita inclusive que a Constituição Federal definiu a obrigação do estado de voltar a planejar o desenvolvimento. Contudo, dependeria da aprovação de legislação específica, que nunca foi mandada ao Congresso Nacional.

Lula e Dilma

Já durante as gestões petistas, o ímpeto planejador é retomado, em certa medida, com a produção de documentos que previam o planejamento de setores estratégicos, como a produção de equipamentos hospitalares, e também nas áreas de transporte e defesa. Contudo, além da falta de uma política coordenada entre todos os setores, esses planos estratégicos também não saíram do papel.

A atuação mais destacada do BNDES, nesse período, se deu no combate às crises econômicas internacionais. “Quando o mercado privado não investe, como ocorreu durante a crise internacional de 2008, o Estado brasileiro tomou a iniciativa de criar investimentos públicos para incentivar os investimentos privados, buscando manter o nível de emprego e de crescimento. O BNDES foi um instrumento para isso. Houve uma ampliação dos recursos do banco, inclusive com recursos do Tesouro, que foram investidos na ampliação de setores da construção civil, de exportação da indústria de alimentos e outros setores importantes.”

 

 

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