
Todo ano é a mesma coisa. Chega setembro e as empresas promovem ações de conscientização e apoio à saúde mental como palestras, distribuição de laços amarelos, campanhas internas que incentivam o uso da cor, dentre outras.
Para Vasleska Pincovai, secretária de Saúde do Sindicato dos Bancários de São Paulo, ações como essas esvaziam o sentido da campanha de prevenção ao suicídio Setembro Amarelo, e não adiantam nada se o assédio moral seguir institucionalizado dentro das empresas.
“O assédio moral no trabalho é um dos principais fatores de adoecimento biopsicossocial. Os cuidados das empresas com a saúde mental deveriam ser tomados o ano todo e não só nas campanhas em setembro.
Muitas delas obrigam os empregados a se engajarem nessas ações enquanto ignoram ou fingem ignorar que muitos desses profissionais estão doentes de ansiedade e depressão justamente por causa das condições de trabalho degradantes”, afirma Valeska Pincovai, secretária de Saúde do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
Afastamentos por transtornos mentais dobram em 10 anos
Nos últimos 10 anos, mais que dobrou o número de afastamentos por transtornos mentais. Em 2014 o INSS concedeu 221.127 benefícios previdenciários, acidentários (B91) ou não (B31). Em 2024 foram 471.649, aumento de 113,3%. Nos bancos o aumento foi ainda maior: 168%. Os dados são do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (SmartLab).
“Transtornos mentais podem levar o suicídio. E transtornos mentais causados pelo trabalho com certeza também podem levar uma pessoa a dar fim à própria vida” afirma Maria Maeno, médica pesquisadora da Fundacentro, fundação pública vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego que pesquisa e promove condições de trabalho seguras e saudáveis.
“Não temos estudos para mensurar a proporção disso, que deve mudar de acordo com a categoria profissional. A rede de apoio e de solidariedade da pessoa nessa situação ajuda muito a evitar esse fim”, acrescenta.
Valeska salienta que o Sindicato recebe praticamente todos os dias casos de bancários que contam já terem pensado em suicídio por causa do trabalho.
“Fora os casos que realmente acontecem e que chegam ao nosso conhecimento por relatos dos bancários, mas não são informados pelos bancos, que não falam sobre esse tipo de morte”, acrescenta.
A dirigente enfatiza que o debate sério e propositivo sobre como eliminar o assédio moral e sexual é um fator central na luta contra o adoecimento mental, que muitas vezes leva ao suicídio.
Outro ponto que precisa ser combatido é a estrutura organizacional das empresas, caracterizada pelo assédio moral para a obtenção de resultados.
“As causas que levam às doenças de ordem psicossocial devem ser debatidas de forma aprofundada pelas empresas o ano todo. Além disso, ouvir os trabalhadores e seus representantes é fundamental para um ambiente de trabalho digno. Esse debate tem que ser permanente com toda a sociedade. Vamos valorizar a vida!”, reforça Valeska.
O que é Setembro Amarelo?
O Setembro Amarelo é uma campanha de conscientização sobre a importância da prevenção do suicídio. A iniciativa surgiu com a ideia de estimular o debate sobre o tema e incentivar as pessoas a buscarem e oferecerem ajuda.
De acordo com a última pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019, são registrados mais de 700 mil suicídios em todo o mundo, sem contar com os episódios subnotificados – com isso, estima-se mais de um milhão de casos. No Brasil, os registros se aproximam de 14 mil casos por ano, ou seja, em média 38 pessoas cometem suicídio por dia.
Embora os números estejam diminuindo em todo o mundo, os países das Américas vão na contramão dessa tendência, com índices que não param de aumentar, segundo a OMS.
Segundo especialistas, praticamente 100% de todos os casos de suicídio estavam relacionados às doenças mentais, principalmente não diagnosticadas ou tratadas incorretamente. Dessa forma, a maioria dos casos poderia ter sido evitada se esses pacientes tivessem acesso ao tratamento psiquiátrico e informações de qualidade.
