Pular para o conteúdo principal

Fórum "entrega" prêmio Falta d'Água a Alckmin

Linha fina
Sem água e sem escolas, estado paulista aprofunda gestão desastrosa, criticam entidades; site IG revela o governador impôs sigilo sobre informações relativas a rodízio
Imagem Destaque

São Paulo - Para a população, racionamento, aumento da tarifa em 21,73% e os transtornos causados pela falta de água. Para o governador do estado, Geraldo Alckmin (PSDB), diploma de menção honrosa, medalha e uma estatueta pelo "reconhecimento" ao trabalho desenvolvido na Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e na Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos do Estado de São Paulo.

A situação pode parecer surreal ou até cômica para alguns, mas é a realidade encarada por cerca de 15 milhões de pessoas afetadas pela crise da água.

Por isso, na tarde da terça 13, os movimentos sindical e sociais realizaram um protesto para entregar a Alckmin o Prêmio Falta d'Água. A atividade foi promovida pelo Coletivo de Luta pela Água e pelo Fórum dos Movimentos Sociais, com apoio da CUT São Paulo.

A manifestação foi um contraponto à premiação entregue no mesmo dia ao governador estadual, "agraciado" em Brasília com o Prêmio Lúcio Costa de Mobilidade, Saneamento e Habitação 2015, na categoria Personalidades. Alckmin foi indicado à Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados por seu colega de partido, o deputado federal João Paulo Papa, mas não foi receber a estatueta pessoalmente - em seu lugar, o governador enviou o secretário de Recursos Hídricos, Benedito Braga.

Quadro nebuloso - Sem nenhuma expectativa de um verão mais ameno que no ano passado, a tendência é de que o racionamento de água se intensifique e leve a um "quadro nebuloso", avalia Edson Aparecido da Silva, coordenador da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental (FNSA) e do Coletivo de Luta pela Água.

"Não teremos volume morto como em 2014 e, novamente, quem mais vai se prejudicar são as pessoas que moram na periferia, nas regiões mais afastadas, porque não têm como armazenar água. É um quadro desolador", afirma.

Maria Auxiliadora Ferreira passava pelo Viaduto do Chá quando resolveu participar da aula pública. Ela também acompanhou as intervenções musicais e trechos da poesia O Rio, do pernambucano João Cabral de Melo Neto, interpretados pelo Núcleo 184, do Teatro Studio Heleny Guariba.

"Moro na Vila Nova Cachoeirinha e são três dias sem água e um com água. Somos seis pessoas em casa e é difícil o banho das crianças, a pilha de louça suja para lavar. Tem que guardar água em balde", relata a dona de casa.

Sem água e sem escolas - Para o professor Douglas Izzo, presidente da CUT/SP, o governo estadual potencializa políticas desastrosas na gestão do recursos hídricos, no atendimento à saúde e na educação.

"O que eles chamam de reorganização é, na verdade, desorganização. Prova disso são as manifestações espontâneas dos estudantes em todo o estado paulista". Sugundo o sindicalista, os movimentos sociais e sindicatos filiados à CUT têm dado o tom das manifestações, "organizando o povo de São Paulo para denunciar esse desgoverno estadual que não consegue dar respostas concretas para nenhum dos problemas do nosso estado", critica.

O deputado estadual Marcos Martins (PT-SP) alertou para a blindagem midiática que encobre os problemas da gestão estadual. "Temos que acreditar na realidade - está faltando água para milhares de pessoas e, quem sente essa falta na pele, não pode acreditar que esse problema mereça ser premiado. A população precisa ir acordando, abrindo os olhos porque não é possível acreditar em Papai Noel e cegonha", afirma.

Gabriel Gonçalves, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), apontou a contradição entre o governo que fez da Sabesp uma empresa com faturamento anual de R$ 2 bilhões e, ao mesmo tempo, que terceiriza e precariza as condições de trabalho na companhia.

"Também é mesmo governo que fecha escolas rurais e que apoia o capital especulativo do setor imobiliário. É uma gestão que vai transformar a água em mercadoria e isso todos nós sabemos", conclui.

Constrangido - Alckmin mandou o secretário de Saneamento e Recursos Hídricos, Benedito Braga, receber o Prêmio Lúcio Costa, embora tenha dito que o prêmio era, “modéstia à parte, merecido”. O governador foi constrangido por críticas e protestos por receber a congratulação mesmo com a Região Metropolitana de São Paulo enfrentando falta de água diariamente, não tendo plano de contingência e sendo sabido que o governo paulista tinha condições de evitar essa situação.

A escolha do secretário não foi por acaso, já que ele é um defensor da gestão de recursos hídricos de Alckmin, desde antes de ser nomeado auxiliar do governador. “A condução da crise por parte do governo de São Paulo e da Sabesp foi absolutamente irrepreensível, dentro dos mais rigorosos padrões técnicos”, afirmou Braga, sobre o prêmio a Alckmin.

Sigilo - E na contramão de dar transparência à gestão, o site IG revelou que o governador decidiu impor sigilo sobre informações relativas a rodízio e manutenção do abastecimento ininterrupto de água, sob alegação de temer “ações terroristas”. Segundo a Sabesp, informar os locais em que não pode faltar água, como hospitais, “poderia ensejar ações com potencial para absoluto descontrole social, colocando inclusive em risco a vida dos pacientes”.

E prossegue: "O dano ou a sua ameaça ao sistema de abastecimento público de água traria enorme prejuízo à sociedade, podendo ensejar inclusive depredações e violência contra os órgãos do Estado. O uso de tais informações para planejamento de ações terroristas é uma hipótese remota, porém, não pode ser descartada".

Porém, no pacote de informações consideradas secretas, às quais a população não poderá ter acesso pelos próximos 15 anos, poderão ser inseridos os motivos de corte no abastecimento que ocorre todos os dias em vários bairros da capital paulista, além de informações sobre a qualidade da água e sobre obras para enfrentamento da crise.


Flaviana Serafim, da CUT São Paulo, com Rede Brasil Atual e edição da Redação - 14/10/2015

seja socio