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Chapéu
Memoria Sindical

Há 40 anos, a luta contra injustiças está no DNA dos empregados da Caixa

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Fotografia mostra mobilização dos empregados da Caixa pela jornada das 6h

Contar a história que levou os economiários da Caixa Econômica Federal a se tornarem bancários é relatar uma parte do que está no DNA dos empregados do banco público brasileiro: a luta contra injustiças. Há 40 anos, para corrigir uma distorção que reduzia direitos e os mantinha em jornada de oito horas, os trabalhadores da Caixa realizaram uma greve, a primeira desde a fundação do banco em 1861. E por 24 horas paralisaram a instituição financeira em todo o país.

<em>Empregados da Caixa em passeata na Paulista: há 40 anos, banco parou em todo o Brasil na luta pelo direito à jornada de seis horas (Crédito: Esdras Martins - Cedoc/Seeb-SP)</em>

Desde que foi criada e durante muitas décadas, a Caixa operava apenas a poupança, não mantinha contas correntes. Seus empregados, então, não eram considerados bancários. O termo economiário consta inclusive do Dicionário Houaiss: “pertencente ou relativo à Caixa Econômica Federal”, ou simplesmente “funcionário da Caixa”, conta o livro Tijolo por Tijolo, publicado em 2019 pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), e que lembra parte da história dos empregados do banco público.  

O tempo passou, a instituição se modernizou, implantou novos serviços– notadamente a partir de 1969. Os empregados se adaptaram às mudanças e buscaram o devido reconhecimento, com dignidade, luta que culminou com a paralisação total da Caixa em 1985.

Aquele 30 de outubro de quatro décadas atrás vinha na esteira de um movimento gigantesco realizado pouco antes por bancários em todo o Brasil. A greve da categoria naquele ano paralisou todos os bancos por dois dias, em 11 e 12 de setembro, e garantiu reajuste salarial de 90,78%, além da antecipação de 25% conquistada meses antes. 

Os empregados da Caixa, no entanto, não “pertenciam” à categoria. A insatisfação só crescia no banco público. E não era para menos.

Entre 1980 e 1981, a Caixa realizou concurso público para contratação de 20 mil auxiliares de escritório. Quem passou, ingressou na carreira no banco com salário 50% inferior ao do pessoal que já trabalhava na estatal como escriturário. Novamente uma nomenclatura – a exemplo do que acontecia entre bancários e economiários – era utilizada para diferenciar empregados que realizavam o mesmo tipo de serviço. Os trabalhadores queriam isonomia.

<em>A luta dos trabalhadores da Caixa era também pelo direito ao reconhecimento como bancários e à sindicalização, unidade que fortalece a categoria (Crédito: Cedoc/Seeb-SP)</em>

É nesse ambiente em ebulição que a direção da Caixa, em 1984, promove dois processos seletivos para o enquadramento de 4 mil escriturários, dos 20 mil concursados. Um grupo de trabalhadores inclusive, sobretudo em São Paulo, recusou-se a fazer as provas e alguns foram demitidos.

A injustiça reforça a mobilização entre os empregados que agora queriam, além da isonomia como o enquadramento de todos os 20 mil escriturários aprovados no concurso, o direito à jornada de seis horas e à sindicalização, eo reconhecimento dos empregados da Caixa como bancários.

Luta que nunca para

O Brasil vivia ainda sob a sombra da ditadura militar, mas os trabalhadores da Caixa se organizavam. Em 20 de outubro de 1985, a mobilização construída ao longo dos anos anteriores resulta na realização do 1º Congresso Nacional dos Empregados da Caixa Econômica Federal. Era o 1º Conecef, em Brasília (DF), onde os trabalhadores decidiram a deflagração da greve em 30 de outubro.

Diante da força do movimento, a união entre os trabalhadores garantiu a tramitação, em regime de urgência na Câmara dos Deputados, do projeto de lei que determinou a jornada das seis horas para os empregados da Caixa. Sancionada em 17 de dezembro de 1985, no dia seguinte o Diário Oficial da União trazia ainda a garantia do direito à sindicalização de todos os empregados da Caixa, viabilizada com a alteração do parágrafo único do artigo 556 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Em 1º de janeiro de 1987, entra em vigor a jornada de seis horas. O direito a se sindicalizarem fazia justiça e permitia que esses trabalhadores, que atuavam como bancários, assegurassem outras conquistas da categoria.

<em>Paralisação do tradicional prédio da avenida Paulista: bancários da Caixa têm atuação fundamental à sociedade, notadamente no pagamento de benefícios dos programas sociais (Crédito: Esdras Martins - Cedoc/Seeb-SP)</em>

Orgulhoso por ter protagonizado aquele momento histórico junto ao pessoal da Caixa, o presidente da Fenae, Sergio Takemoto, destaca a capacidade de luta dos trabalhadores.

“Foi o início de um processo que não para, por mais direitos e contra qualquer ameaça de privatização do patrimônio público”, afirma. “Esse movimento serve de referência histórica para a continuidade da nossa luta, que nunca para, por melhores condições de trabalho e por atendimento adequado à população”, completa.

A presidenta do Sindicato, Neiva Ribeiro, lembra que os empregados da Caixa, até hoje, são os maiores responsáveis pela manutenção e importância do banco público. “A união da categoria bancária, trabalhadores de bancos públicos e privados, e a organização ao lado dos seus sindicatos, garante ano após ano a manutenção de direitos conquistados em lutas históricas como essa dos empregados da Caixa, e o avanço que traz novas e importantes cláusulas à nossa Convenção Coletiva de Trabalho” avalia a dirigente. “Somos uma categoria que luta por salário, condições de trabalho, e também por uma sociedade mais justa e igualitária, como tantos fizeram antes de nós nesses mais de 100 anos de história. E assim seguiremos.”

<em>Bancário de São Paulo, Takemoto participou de toda mobilização em 1985: processo que não para, por mais direitos e defesa do banco público (Crédito: Cedoc/Seeb-SP)</em>

passo a passo da mobilização em 1985

  • 6 de agosto: Dia Nacional de Luta. Empregados da Caixa distribuem cartas abertas à população e enviam telegramas ao Ministério da Fazenda
  • 11 de agosto: Paralisações de duas horas realizadas em agências de Brasília e do Ceará
  • 11 de setembro: Presidente da Fenae à época, José Gabrielense recebe mensagem informando que o ministro da Fazenda havia se manifestado contrário às reivindicações da categoria
  • 13 de setembro: Cerca de 800 empregados da Caixa protestam e realizam uma passeata na Avenida Paulista, em São Paulo
  • 19 e 20 de outubro: Realização do 1º Conecef, em Brasília, no qual mais de 500 pessoas aprovam a data de 30 de outubro para a greve de 24 horas
  • 30 de outubro: Greve histórica, quando todas as unidades da Caixa são fechadas Brasil afora
  • 4 de novembro: Caravanas de empregados da Caixa ocupam Brasília. Pressionado, o deputado federal Pimenta da Veiga dá aval para o regime de urgência ao projeto de lei que estabelece a jornada de seis horas para a categoria.
  • 28 de novembro: Projeto das seis horas é aprovado na Câmara dos Deputados. No mês seguinte, a proposta também passa pelo Senado Federal.
  • 17 de dezembro: Presidente da República, José Sarney, sanciona a lei que garante a condição de bancário aos empregados da Caixa.
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