Pular para o conteúdo principal

Milhares marcham em apoio a movimentos e ocupações por moradia

Linha fina
Após incêndio que derrubou prédio no dia 1º de maio, no centro da capital paulista, moradores de ocupações e ativistas cobraram, em passeata, políticas de habitação e rechaçaram criminalização das vítimas
Imagem Destaque
Foto: Seeb-SP

Milhares de trabalhadores que moram em ocupações e ativistas da luta por moradia realizaram na quarta-feira 9 um ato no centro de São Paulo. A manifestação começou por volta das 14h na Praça da Sé e seguiu em passeata pelas ruas do Centro até chegar, por volta das 17h30, ao Largo do Paissandu. No local, prestaram solidariedade às vítimas do desabamento, em 1º de maio, do prédio ocupado que caiu após um incêndio. E celebraram um ato ecumênico.

> Sindicato recebe doações para desabrigados de prédio que desabou

Na pauta central da manifestação, a não criminalização dos movimentos sociais e a reivindicação por políticas públicas voltadas para a habitação popular e o respeito ao princípio constitucional da função social da propriedade.

“Esse é um ato em defesa das ocupações. As famílias estão sendo criminalizadas e, na verdade, elas são vítimas do poder público que não as atendeu com moradias e políticas adequadas. Estamos cobrando moradias dignas. Há mais de 20 anos o PSDB governa São Paulo e não fez nada para a população de baixa renda. Agora, o presidente (Michel Temer, do MDB) cortou o Minha Casa Minha Vida que era o único programa que vinha beneficiando a população”, disse à reportagem da Rede Brasil Atual a coordenadora da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo, Graça Xavier.

> Cerca de 360 mil famílias não têm onde morar na cidade de São Paulo

Graça acusa o poder público de negligenciar a promoção de políticas de acesso à habitação e de privilegiar beneficiários da especulação imobiliária. “Tanto município quanto estado não destinam recursos para moradia. Eles apoiam as grandes construtoras e não aplicam ferramentas necessárias como o IPTU progressivo para garantir a função social da propriedade”, disse sobre a medida já prevista pelo Plano Diretor Estratégico (PDE), aprovado durante o governo do ex-prefeito Fernando Haddad (PT), mas com pouca aplicação pelo governo que o sucedeu, de João Doria (PSDB). 

Doria foi criticado também por uma declaração por meio da qual acusou as ocupações de serem comandadas por “facções criminosas”. O ex-ministro Luiz Marinho, presidente estadual do PT, disse que Doria é um prefeito sem palavras. "Se comprometeu a ser prefeito e nunca foi. É sem caráter e sem palavras. Ele disse que as ocupações são feitas por facções. Mas o que é criminosa é sua fala. Só existe ocupação porque as políticas públicas não são suficientes para resolver os problemas do povo pobre trabalhador."

Ocupação é fruto do abandono

O pré-candidato à presidência da República pelo Psol, Guilherme Boulos, rebateu aqueles que culpam movimentos sociais por tragédias em ocupações. “A ocupação é fruto do abandono. Tentaram culpar as vítimas pela tragédia. Ninguém ocupa porque quer. As pessoas não têm alternativa. Ocupam porque não conseguem pagar o aluguel e têm que escolher entre pagar o proprietário ou colocar comida da mesa. Não vão acabar com as ocupações mentindo e atacando as vítimas”, disse o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).

“Não vamos aceitar que usem a tragédia para criminalizar os movimentos sociais deste país. Se tem algum criminoso aqui é o MDB do Michel Temer que governa em cima de roubo e corrupção. Quem luta por moradia não é criminoso. E que também não peguem práticas isoladas para julgar o conjunto dos movimentos sociais. Os movimentos de luta por moradia em todo o país estão unidos para exigir uma política pública de habitação que faça de cada ocupação não o despejo, mas faça moradia digna”, completou Boulos.

O coordenador da Central de Movimentos Populares e da Frente Brasil Popular, Raimundo Bonfim, afirmou que a imprensa comercial tenta culpar movimentos sociais pela tragédia no Paissandu. “A mídia tenta se aproveitar da situação para tentar criminalizar quem luta por reforma urbana e moradia. Mas eles não vão conseguir porque os movimentos têm história e luta. São reconhecidos e com conquistas. Estamos em uma batalha entre os que querem a cidade apenas para lucrar e aqueles que precisam dela para morar. É uma luta entre nós e a especulação imobiliária.”

O ex-deputado Adriano Diogo (PT) questionou a natureza do incêndio no prédio, que pertencia ao governo federal. “Minha pergunta é como o prédio pegou fogo. Esse incêndio tem que ser esclarecido. Esse prédio nunca foi condenado pela Prefeitura. Não foi inviabilizado pelos bombeiros”, disse.

 

“Concreto não pega fogo. Aço não pega fogo. A forma com que o prédio pegou fogo foi muito estranha. O fogo foi de baixo para cima uniformemente. O prédio caiu de forma verticalizada, como se tivesse sido implodido. Essa é a questão mais séria. Não estou fazendo nenhuma acusação irresponsável, mas já vimos incêndios como o Joelma e o Andraus. As estruturas ficaram intactas. Como os alicerces pegaram fogo? Concreto e cimento com aço. Como derreteram? Por que não caiu para um lado ou para o outro. Muito estranho”, completou.

Uma semana depois da Paissandu, famílias estão abandonadas
‘Setor imobiliário não quer pobre morando no centro de São Paulo’
CUT presta apoio às vítimas de incêndio em ocupação em SP
Prefeitura promete solução em um mês para vítimas de desabamento
Culpar vítimas é 'desfaçatez', diz Ermínia Maricato

Vistorias nas ocupações

A prefeitura, sob vistoria do Ministério Público, criou uma força tarefa no dia depois do incêndio para realizar vistorias a fim de mitigar problemas em ocupações. Os movimentos sociais participam da iniciativa, que começou na segunda-feira, com um estudo dos critérios para a verificação. Até o momento, duas ocupações foram visitadas no centro da cidade. “Um prédio da Frente de Luta por Moradia e outro do Movimento de Moradia para Todos”, disse Graça Xavier.

“Começaram com as vistorias e deixamos bem claro que os movimentos, quando ocupam, pegam os prédios detonados porque estão abandonados, às vezes, mais de 10 anos, servindo para especulação imobiliária. Os movimentos ocupam, fazem a limpeza e organizam tudo. Queremos que as famílias tenham dignidade. Abrimos as portas para a prefeitura, mas os movimentos estão juntos até para não distorcerem o que acontece lá dentro”, disse.

O município ainda não divulgou nenhum parecer sobre as vistorias, apenas informou que cinco edifícios do entorno do Wilton Paes de Almeida, que pegou fogo, seguem interditados por falta de segurança, além de informar que 56 famílias que ali moravam começaram a receber um auxílio-moradia.

A administração ainda argumenta que, para zerar o déficit habitacional da cidade, hoje estimado em 358 mil moradias, seriam necessários 120 anos com o orçamento corrente. Para tentar mudar a situação, movimentos sociais estão em Brasília entre hoje e amanhã para cobrar mais recursos da União.

“Estamos com uma comissão em Brasília para cobrar também a retomada do Minha Casa Minha Vida. Também estamos preparando uma grande caravana, seguida de ocupação, entre os dias 5 e 7 de junho em Brasília. Será uma caravana de movimentos rurais e urbanos. Estamos chamando toda a população, precisamos fazer com que o governo federal compreenda de vez que o déficit habitacional é um problema dele e que as famílias de baixa renda precisam de políticas”, completou Graça.

seja socio