Nesta segunda-feira, 17 de maio - data em que se celebra o Dia Internacional contra a LGBTfobia - o Sindicato realizou um debate virtual, por iniciativa do coletivo LGBTQIA+ da entidade, com a presença do antropólogo e advogado Lucas Bulgarelli, fundador e diretor do Instituto Matizes - Pesquisa e Educação para a Equidade.
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“Durante quase todo o século XX, nós, pessoas LGBTQIA+, éramos considerados doentes. Até 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) colocava no catálogo internacional de doenças(CID), no número 302, o nome homossexualismo, uma forma de dizer que uma pessoa que manifestasse ser LGBTQIA+ ela era compreendida como doente. Foi no dia 17 de maio de 1990 que isso mudou”, explicou Lucas na abertura da sua fala.
De acordo com Bulgarelli, as lutas contra a descriminação LGBTfóbica derivam da esquerda. “Elas começaram a existir em um contexto de lutas junto ao movimento sindical, ao movimento negro, feminista. Era um movimento de democratização. A gente não podia falar de direitos em uma ditadura. Tivemos que reconstruir a democracia para que a gente pudesse começar a falar de direitos.”
Lucas trouxe para o debate também a noção de que a discriminação não é apenas a violência física - que leva o Brasil a ocupar, por 12 anos consecutivos, o posto de país que mais mata pessoas transexuais no mundo - mas também a discriminação do dia a dia,
“A discriminação também é a piadinha que fazemos de vez em quando, o comentário, a brincadeira. Essa piada, essa brincadeira, constrói a ideia de que podemos ser discriminados. É ela que contribui para a agressão, para o assassinato. É a mesma ideia de tratar as identidades LGBTQIA+ como identidades doentes, como doença, como algo que pode ser curado. Quando ouvimos hoje políticos conservadores falarem em cura gay, nós sabemos que isso vem lá de trás, de uma ideia construída por séculos”, enfatizou.
“E a gente também sabe qual é o nosso lugar na história. Nosso lugar nunca foi um lugar de aceitação. Se hoje a gente está aqui, se hoje temos este dia 17 de maio, foi porque teve luta, teve resistência, de lésbicas, gays, travestis, bissexuais, transexuais, muitos deles trabalhadores e trabalhadoras. Pessoas que lá atrás disseram que a gente existe, que a gente não é doente, que a gente precisa ser respeitado”
Lucas Bulgarelli
Sobre o momento atual, Lucas avalia que a conjuntura para a luta por direitos e respeito à população LGBTQIA+ piorou significativamente. “Temos na presidência, na Câmara dos Deputados, no Senado, pessoas que fazem propaganda contrária à população LGBTQIA+. Pessoas que estimulam o cidadão a se armar contra a gente, a ir atrás da gente. Isso está acontecendo nas escolas, com projetos de lei que falam em ideologia de gênero. Continuamente, acompanhamos as forças conservadoras indo atrás da gente. Isso pelo fato de fazemos uma luta pelo amor. A gente quer amar. E isso incomoda muita gente.”
“Quando falamos do dia 17 de maio, estamos honrando a memórias de todas as pessoas LGBTQIA+ que foram vitimadas ao longo da história. Seja pela medicina, seja pelo Estado, que reprimiu e perseguiu a gente durante a ditadura militar; seja por um contexto atual em que existem presidente, deputados, senadores e ministros que estão literalmente disponíveis para produzir políticas que aumentam ainda mais a violência contra a gente”
Lucas Bougarelli.
Para Lucas, não existe contradição entre o neoliberalismo e a postura conservadora adotada enfaticamente pelo governo Bolsonaro.
“A Damares e o Guedes não possuem nenhum plano contraditório entre eles. Ser conservador e ser neoliberal, hoje em dia, está na mesma base de pensamento. O neoliberalismo tira a nossa fé coletiva, a crença de que não precisamos aceitar o que o capital diz. O neoliberalismo diz para a pessoa que ela deve acreditar que ela é um empreendedor individual, que é a dona dela mesma, que tem de correr atrás, que o Estado não tem que lhe dar nada, que é a sua família que tem de cuidar da sua vida (…) Você precariza o Estado e faz com que a família cuide de todas as demandas, substituindo qualquer política pública. Porém, a família, no caso das pessoas LGBT, ainda é um lugar de agressão”, explicou o diretor do Instituto Matizes.
“Fico muito feliz de estar em um sindicato que é referência de lutas não só pela classe, mas referência de lutas pelas mulheres, pelas pautas LGBTQIA+, e ter o privilégio de debater essas questões em alto nível. (…) A luta LGBTQIA+ é uma luta democrática, pela democracia, por um país melhor. Esse é um compromisso de todos nós”, concluiu Lucas Bulgarelli.
LUCAS BULGARELLI é diretor e fundador do Instituto Matizes - Pesquisa e Educação para a Equidade. Pesquisador, Antropólogo, Advogado e Palestrante sobre Diversidade e Inclusão com foco LGBTQIA+. Bacharel em Direito (USP), mestre (USP) e doutorando (USP) em Antropologia Social.