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Racismo é tema de fórum no Sindicato

Linha fina
Discussões vão ajudar a pautar Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, em novembro
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São Paulo – Políticas de promoção da igualdade e enfrentamento ao racismo foram temas discutidos na plenária Democracia e Desenvolvimento: por um São Paulo contra o racismo, promovida pelo Sindicato. O encontro antecede as conferências regionais de promoção para igualdade racial das regiões Sudoeste, Sudeste e Oeste da capital paulista, marcadas para sexta-feira 2 e sábado 3.

A plenária, ocorrida na quarta-feira 31, teve como convidados a pesquisadora e doutora em psicologia social Lia Vainer Schucman, a diretora para programas no Brasil e Paraguai da AFL-CIO Solidarity e diretora do Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial (Inspir), Jana Silverman, o doutor em ciências da comunicação, comunicação sindical, globalização neoliberal e mundo do trabalho Dennis de Oliveira.

A diretora executiva do Sindicato Maria Rosani foi a mediadora e abriu os trabalhos da mesa destacando que desde os anos 1980, com a aplicação do conceito de Sindicato Cidadão, diversas cláusulas do acordo coletivo sobre a diversidade e a igualdade de oportunidades foram conquistadas pela categoria bancária.

Rosani ressaltou que a participação dos negros nos quadros profissionais dos bancos, no entanto, ainda é muito pequeno, e citou levantamento realizado pelo Sindicato entre 2008 e 2009 que apontou que apenas 3% da categoria bancária é formada por negros. “Essa é uma realidade que precisa mudar e, pensando nisso, propusemos essa plenária para discutir formas de alterar esse quadro.”

Este ano, umas das pautas no tema igualdade de oportunidades reivindica a contratação de pelo menos 20% de trabalhadores afrodescentes.

Para o dirigente Júlio Cesar Silva Santos, coordenador do Coletivo de Combate ao Racismo do Sindicato, muitas vezes dirigentes negros ou não negros não se identificam com a bandeira da igualdade racial. “Para termos igualdade de oportunidades e um mundo equilibrado no mercado de trabalho, temos de vencer a distância enorme entre os diversos grupos sociais, e essa distância deve servir de mola propulsora para nossa união.”

Abolição inconclusa – O acadêmico Dennis de Oliveira defendeu a tese de que no Brasil houve uma abolição da escravidão inacabada ou inconclusa, resultado de uma série de leis como a do Ventre Livre, que “libertava” o filho da mulher escrava, mas a mantinha na escravidão, e do Sexagenário, que libertava o escravo com mais de 60 anos, mas que, na prática, era uma forma de libertar os senhores de escravo da responsabilidade de alimentar e abrigar o trabalhador que já não era capaz de produzir. Essas leis, de acordo com Dennis, geraram um processo gradual de abolição, controlado pelas elites e que manteve seus privilégios. 

 Essa abolição inconclusa, segundo Dennis, configurou no país um capitalismo que não rompeu completamente com a ordem escravagista anterior e que mantém características típicas do sistema de mão de obra escarava, sendo visível até os dias atuais. Como exemplo, o acadêmico citou a dificuldade de se aprovar a extensão da Consolidação das Leis de Trabalho para os trabalhadores domésticos e as reações contrárias que a mudança gerou.

 “A mídia tratou essa extensão como a ‘a nova lei dos empregados domésticos’, mas não é uma nova lei. Na verdade estão formalizando o trabalho doméstico como o de qualquer outra categoria. Quando foi proposto colocar uma relação trabalhista para os empregados domésticos regulada com o capitalismo, como determina a CLT, houve uma reação contrária, e isso demonstra como as relações de trabalho na sociedade brasileira estão marcadas pelo escravismo”, afirma Dennis.

Segundo Dennis, para acelerar o processo de igualdade racial, é fundamental o movimento negro pensar em estratégias para a participação nos espaços institucionais, como a Seppir (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), ligada à Presidência da República, por meio de fóruns como a Conapir (Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial). “O racismo no Brasil é uma questão estrutural, portanto apenas ações institucionais não são suficientes. É preciso haver mobilizações sociais para que se possa mudar o quadro social”, completa.

 Branquitude – A doutora em psicologia Lia Vainer Schucman apresentou os resultados da sua tese de doutorado, intitulada Raça, Hierarquia e Poder na Construção da Branquitude Paulistana. Em sua pesquisa, a psicóloga entrevistou desde oriundos das famílias quatrocentonas paulistas até moradores de rua, porém em comum, todos brancos e nascidos na capital paulista. O intuito da tese foi entender como a apropriação do conceito raça se dá pelos sujeitos brancos.

De acordo com a psicóloga, o conceito de raça foi criado no século XIX, na Europa, e só existe o racismo porque existe esse conceito. “Ele tem um efeito que inferioriza a população negra, mas também causa um efeito fictício de superioridade humana na população branca, ligada à civilização, à moral, ao intelecto, ao estético e a toda uma ideia de civilização e progresso por trás dessa identidade racial branca.”

Uma segunda parte da tese aborda como a ideia de raça faz efeito sobre a população branca. Lia explica que na visão dos brancos entrevistados existem diferentes tipos de brancos. “A pesquisa mostrou que entre os entrevistados, o branco de origem nordestina não é tão branco quanto o branco paulistano de ascendência europeia. As maiores conclusões da tese são de que a própria categoria raça hierarquiza o sujeito branco e contrapõe os sujeitos não brancos”, explica.

A diretora para programas no Brasil e Paraguai da AFL-CIO Solidarity e diretora do Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial (Inspir), Jana Silverman, lembrou que no seu país, os Estados Unidos, ainda hoje o racismo é muito presente.

“Nós, do movimento sindical americano, ainda vivemos os estragos desse racismo institucional e estrutural, sobretudo no sul do país, onde as taxas de sindicalização são muito baixas. O racismo é um produto para dividir a classe trabalhadora”, considera a sindicalista.

Conapir – A Conferência Estadual de Promoção de Igualdade está marcada para 23 e 25 de agosto. A partir dos debates, realizados também nas etapas municipais em várias cidades de todo os país, serão definidos os encaminhamentos e os delegados que participarão do encontro nacional, a III Conapir, de 5 a 7 de novembro, em Brasília.


Rodolfo Wrolli - 1/8/2013

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