A Bancada Ativista (Psol) na Assembleia Legislativa de São Paulo anunciou que vai ingressar com ação direta de inconstitucionalidade (ADI) contra a liberação de partos cesarianas a pedido no Sistema Único de Saúde (SUS) do estado. O Projeto de Lei (PL) 435/2019, de autoria da deputada Janaína Paschoal (PSL), foi aprovado na Assembleia, no dia 14, com 58 votos a favor e 20 contrários. O texto aguarda a sanção do governador João Doria (PSDB). Na prática, independente de indicação médica, as mulheres poderão pedir que seja realizado um parto cesariana a partir da 39ª semana de gestação.
A reportagem é da Rede Brasil Atual.
O projeto não tramitou nas comissões da casa e foi ao plenário por um acordo partidário entre PSDB e PSL. Apenas uma audiência pública e um debate técnico foram realizados. Em ambos os casos, a maioria dos especialistas em saúde da mulher se manifestou contra a proposta. A principal preocupação é que o projeto sirva de álibi para a realização de partos cesarianas desnecessários, que são mais rápidos, mas apresentam maior risco de complicação e no processo de recuperação. A justificativa da deputada era dar mais autonomia à mulher e prevenir a violência obstétrica.
“Esse projeto precisa ser discutido qualificadamente em várias camadas. O SUS é onde as mulheres conseguem, no limite, ter seus filhos de maneiras fisiológicas (sem intervenção). O parto cesariano não é a solução para a violência obstétrica dentro do SUS. O projeto é incompleto e não endereça efetivamente a proteção das mães e dos nascituros”, declarou Anne Rami, da Bancada Ativista.
Nas audiências foi defendido que o PL incluísse ações para garantir acesso a informações sobre o parto durante todo o pré-natal, bem como o respeito à legislação já existente, como a Lei estadual 15.759, que regulamenta a humanização do parto na rede estadual de saúde, e o cumprimento do Plano de Atenção Integral à Saúde da Mulher que há anos é ignorado pelo governo paulista.
Em 2018, o Brasil teve aproximadamente 55% dos partos realizados por cesariana. Quando se observa apenas a rede privada, foram quase 85%. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera aceitável uma taxa de até 15% dos partos serem cesarianas. A partir disso, há impacto significativo na ocorrência de mortes maternas: 52% dessas mortes têm causas associadas ao parto por cesariana. Nos partos normais isso fica em torno de 23%.
A presidenta da Rede pela Humanização do Parto e Nascimento e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília, Daphne Rattner, explicou que dados da OMS sobre 290 mil partos indicam um risco seis vezes maior de morte no parto cesariana, além de um risco cinco vezes maior de infecção. O Ministério da Saúde, em 2011, registrava taxa de mortalidade de 18 mortes para cada 100 mil partos por cesariana e 8 mortes para cada 100 mil partos normais.
O Conselho Regional de Enfermagem (Coren), foi contra a proposta. “O PL apresentado está em desacordo com as 56 recomendações emitidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), divulgadas em 2018, que estabelecem padrões de atendimento para reduzir as intervenções desnecessárias no parto. Nas últimas décadas, houve aumento significativo das taxas de cesariana em todo o mundo, sem comprovação de benefícios significativos para a saúde das mulheres e de seus bebês”, defendeu a entidade.