O Itaú foi condenado a pagar indenização de R$ 50 mil a uma ex-bancária que sofreu uma série de práticas que caracterizam assédio sexual e moral. Segundo a ação judicial, a trabalhadora ouvia do gerente regional para que ela “usasse roupas e maquiagens sensuais para captar clientes, inclusive para compensar sua falta de talento”.
Na reclamação trabalhista, ela ainda afirmou que sofria cobrança abusiva de metas, ameaças de demissão e transferência, e divulgação de ranking, esta última, uma prática proibida pela cláusula 39 da Convenção Coletiva de Trabalho da categoria (CCT bancários).
A situação levou a trabalhadora a desenvolver um quadro de depressão, comprovado por atestados médicos.
Na sentença que condenou o Itaú, o ministro relator, Alberto Bresciani, considerou que o banco, por intermédio do gerente, “(…) impôs, de certa forma a mercantilização da honra da Obreira [trabalhadora], visou transformar em cifras a maneira como ela era vista pelo sexo oposto, ou pelo mesmo sexo. Dessa forma, incorreu-se efetivamente em uma conduta extremamente machista, repugnante e inadequada, o que, certamente caracteriza o dano moral sofrido pela Parte-Autora”.
“Dessa maneira, nota-se que o objetivo do apontado assediador, em abstrato (…) seria o lucro, os resultados a qualquer custo e não se aproveitar da situação funcional para favores com o condão sexual para si, mas para outrem (o Banco) de forma indireta, o que não elide a possibilidade de classificação de assédio sexual”, enfatizou o relator na sentença.
O banco havia sido condenado a pagar R$ 500 mil de indenização, mas o valor foi reduzido para R$ 8.000 pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC). O caso chegou ao Tribunal Superior do Trabalho e o colegiado, em decisão unânime, decidiu que o valor não refletia a essência e a intensidade do dano, determinando que o banco a indenize em R$ 50 mil.
Em nota ao UOL, que divulgou em primeira mão a condenação, o Itaú afirmou ter “sólidos princípios éticos e repudiar veementemente qualquer tipo de assédio ou conduta desrespeitosa”. A instituição ainda disse que não recorrerá da decisão judicial, que deve ser “cumprida dentro dos prazos legais.”.
Roupa “de bater meta”
A dirigente sindical e bancária do Itaú Adriana Magalhães ressalta que, apesar de os bancos condenarem e coibirem em seus códigos de ética o assédio sexual, não é incomum gestores se comportarem de forma machista.
“Inclusive é muito usual e corriqueiro o termo 'roupa de bater meta', demonstrando que há necessidade de se combater o machismo na estrutura, não apenas com cartilhas, mas com reflexão. Aliás, combater o assédio sexual, moral e racial com uma nova cultura deveria ser uma meta positiva para a Febraban.”
Adriana Magalhães, dirigente sindical e bancária do Itaú
O depoimento de uma bancária do Banco do Brasil ilustra a realidade e reforça que o assédio moral e sexual para obtenção de lucro é bastante comum. “Aconteceu quando eu era gerente de relacionamento pessoa jurídica. A gente estava em uma reunião, porque no dia seguinte nós teríamos um desafio de vendas de capitalização. O gerente-geral da agência falou, naquele tom de 'brincadeira', que eu deveria, no dia seguinte, vir trabalhar de saia e decote para cumprir a meta de venda da agência. Eu era a única gerente pessoa jurídica mulher da agência e eu me senti péssima, fiquei extremamente constrangida, principalmente por ser a única mulher”, diz a bancária.
“A sensação que eu tive é que todo o trabalho que eu fazia não era suficiente, porque no fim eu era resumida a um corpo que deveria ser exposto para vender um produto. Meu estudo, minha dedicação, meu conhecimento, o relacionamento que eu construí com os clientes, nada disso valia. A única coisa que estava sendo levada em consideração era o fato de eu ser uma mulher expondo o corpo para vender o produto. Eu era muito nova e a única mulher, e foi algo que eu não esqueci”, conta a trabalhadora.
Bancária do Banco do Brasil vítima de assédio sexual
Combate ao assédio sexual e moral nos bancos
Desde 2010, os bancários contam com um instrumento de combate ao assédio moral, conquistado após grande mobilização na Campanha Nacional Unificada. O canal também prevê denúncias de assédio sexual, garantindo confiabilidade e sigilo à vítima.
Em 2014, a categoria garantiu a inclusão, na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), de uma cláusula que prevê que o monitoramento de resultados – nome que os bancos dão para a cobrança por metas – seja feito “com equilíbrio, respeito e de forma positiva para prevenir conflitos nas relações de trabalho”.
Violência sexual e doméstica na categoria bancária
A categoria bancária conquistou, na Campanha Nacional dos Bancários 2020, a inclusão das cláusulas 48 a 54 na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), de prevenção à violência contra a mulher.
Entre as medidas conquistadas estão: comunicado interno, a ser enviado pelos bancos aos trabalhadores, sobre prevenção à violência doméstica e familiar contra a mulher; canal de apoio à bancária vítima de violência; e outras medidas de apoio como, por exemplo, a realocação da bancária vítima de violência em outro local de trabalho, garantindo o sigilo do mesmo, e linha de crédito ou financiamento especial para estas mulheres.
O Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região também mantém o serviço “Basta! Não irão nos calar”, de atendimento jurídico especializado a mulheres vítimas de violência doméstica e de gênero. O agendamento, que está sendo realizado via Central de Atendimento, por chat ou pelo telefone 3188-5200, agora também poderá ser feito via Whatsapp por meio do número 11 97325-7975 (Clique aqui para falar diretamente via WhatsApp).
“Mas para que, de fato, o combate a violência sexual seja efetivo, é preciso haver a denúncia. Mas também é fundamental que os bancos reforcem e coíbam com ênfase a prática do assédio moral e sexual dentro de suas estruturas, para que situações como a vivenciada pela bancária do Itaú não se repitam.”
Adriana Magalhães, dirigente sindical e bancária do Itaú