São Paulo – Para o Santander não basta contribuir com o cenário de 14 milhões de desempregados. O banco espanhol agora quer lucrar (ainda mais) com a escassez de vagas fazendo a população acreditar que o serviço autônomo, sem garantias sociais como seguro desemprego, multa rescisória, FGTS, férias remuneradas e 13º, é mais vantajoso. Para isso, emplacou uma campanha publicitária para vender sua máquina de cobrança via cartões, a Getnet, ou “vermelhinha”.
O slogan da campanha para vender a máquina não poderia ser mais cínico: “Empreendedor. Esta é a sua nova carteira de trabalho”.
De junho de 2016 a junho de 2017, o Santander eliminou 2.281 postos de trabalho. Por outro lado, lucrou como nunca. Nos primeiros seis meses de 2017, o banco espanhol ganhou R$ 4,612 bilhões – seu maior resultado para um semestre. O montante representa crescimento de 33,2% em relação ao mesmo período de 2016. Esse resultado significa 26% do lucro global do banco espanhol, sendo o Brasil o país mais lucrativo para a instituição.
Precarização – Para o diretor executivo do Sindicato e bancário do Santander Marcelo Gonçalves, a publicidade esconde que o desemprego é um problema estrutural e resultado de uma crise política e financeira. “A campanha vende a ideia que esse é um problema individual e que se tornar autônomo e virar o seu próprio patrão é uma solução moderna. Sabemos que isso só funcionará para pouquíssimas pessoas. A maioria conviverá com a precarização.”
É o caso da Ivana Almeida Barreto. Depois de perder o emprego como massoterapeuta em um hotel de Manaus, mudou-se para São Paulo há cerca de um ano e hoje trabalha das 7h às 18h vendendo artesanato nas ruas. Ela usa a Getnet do Santander. “Preferia trabalhar com carteira assinada, por causa da aposentadoria, FGTS. É um seguro para a gente, né?”
Carona na crise – Para a pesquisadora e professora da Faculdade 28 de Agosto, Ana Tercia Sanches, o Santander pegou uma carona na crise que o Brasil vive.
“O banco acena com a ideia de que diante de um cenário de 14 milhões de desempregados, a saída é ser dono do próprio negócio, mas o conceito de empreender não pode ser infantilizado. Em um realidade de crise, a maioria não abre empresa como opção, mas como falta de opção. E muitos trabalhadores demitidos investem todo o dinheiro da indenização e as economias de uma vida em um negócio sem muitas vezes levar em conta que o índice de falências das empresas é imenso”, avalia Ana Tercia.
Seis em cada dez – De cada dez empresas, seis não sobrevivem após cinco anos de atividade, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Os dados são referentes a 2014, e são retirados do Cempre (Cadastro Central de Empresas).
No ano passado, o número de pedidos de falência cresceu 12,2%. Também houve crescimento nas falências decretadas (14,7%) e nos pedidos de recuperação judicial (49,4%). O maior número de pedidos de falência em 2016 aconteceu no setor de serviços: 39%.
É o segundo ano consecutivo com uma alta de dois dígitos, algo inédito desde que a série histórica foi iniciada pelo SCPC Boa Vista, em 2006.
A velha ganância – “Contrapor uma tecnologia e um produto financeiro [a Getnet] à carteira de trabalho, ou seja, aos direitos dos brasileiros, está longe de representar alguma modernidade”, afirma Marcelo. “Apenas reforça a velha ganância de um setor financeiro que expropria parte da renda dos trabalhadores cobrando juros exorbitantes e absurdos, além de insistir na violenta e brutal lógica econômica que concentra renda e riqueza na mão de poucos, em oposição a qualquer política de justiça econômica, que gere emprego, mais renda e direitos para toda a sociedade brasileira.”
A diretora executiva do Sindicato e bancária do Santander Maria Rosani lembra que além de contribuir com o desemprego e querer lucrar com essa realidade promovendo a venda de um produto, o presidente do banco espanhol no Brasil, Sérgio Rial, ainda defendeu a reforma trabalhista.
“São mudanças que praticamente acabaram com os direitos dos trabalhadores ao legalizar, dentre outras atrocidades, a contratação de trabalho autônomo no qual o empregado não terá direito a FGTS, seguro desemprego, férias remuneradas, 13º salário, multa rescisória. É inaceitável uma empresa estrangeira que lucra tanto no Brasil tratar os brasileiros com tanto desrespeito”, afirma Maria Rosani.