São Paulo – Organizações da sociedade civil realizam na terça 3 uma mesa de debate sobre o Plano Municipal de Desestatizações, a agenda privatista comandada pela gestão do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB). As entidades são críticas às propostas, como o Projeto de Lei 367, que autoriza a transferência de equipamentos e serviços públicos à iniciativa privada, sob justificativa de reduzir gastos dos cofres públicos, o que é questionável.
“O custo não se reduz, como afirma o discurso da prefeitura. Em muitos casos, ele se mantém ou se mostra muito elevado e, também, traz implicações para os usuários. Se os contratos não são bem específicos, acabam tendo muitos problemas para os beneficiários e para o próprio projeto, como sua não implementação”, afirma a representante do Instituto Polis Danielle Klintowitz, segundo matéria da Rede Brasil Atual. Ela é uma das organizadoras do debate. Para as entidades, a presente lei atua em oposição às leis orgânicas do estado e do município, que preveem a elaboração de leis específicas para cada iniciativa privatista.
Danielle explica que a razão para haver necessidade de elaboração de texto específico é “primeiramente, a discussão com a sociedade, porque cada lei deve passar por trâmites no Legislativo, como audiências públicas. E uma segunda razão é entender cada serviço e cada bem. Se faz sentido ser concedido ou não e quais as suas implicações. Essa lei autoriza concessões sem que passe pela Câmara, então, perdemos o detalhamento e o entendimento do que está acontecendo”, afirma.
O debate de hoje está marcado para as 19h, na sede do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-SP). Intitulada “O Plano Municipal: O papel do poder público e a função social da cidade”, a mesa é a segunda parte de uma sequência de três encontros sobre o tema. O anterior, realizado na segunda-feira 25, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), teve como proposta a análise de concessões em governos anteriores, bem como suas consequências. Hoje, o tema é o plano atual e sua condução. Na semana que vem, o ciclo será encerrado com um debate propositivo na Câmara Municipal paulistana.
“O debate final tem a ideia de discutir alternativas. Modelos de gestão de serviços na cidade. Existe um discurso corrente em São Paulo e em todo o Brasil de que a única solução para os problemas do Estado é a privatização. É o argumento de que o serviço público não pode mais ser feito pelo Estado. Nossa ideia é pensar outras possibilidades: modelos de gestão que visam à participação popular e respeitam a função social da cidade”, completa Danielle.
Em nota, a Rede Nossa São Paulo, que também organiza os encontros, reforça a necessidade de maior análise e diálogo com a sociedade. “A gestão pública tem a responsabilidade de garantir o direito à cidade para todos os seus habitantes. Garantindo assim a toda a população o acesso à infraestrutura urbana e a serviços de qualidade, fazendo com que todos possam desfrutar da cidade de maneira integral, independentemente da região onde mora e realiza suas tarefas cotidianas.”
“Para organizações da sociedade civil, a privatização de serviços e equipamentos, como mercados, sacolões, terminais de ônibus e bilhete único, entre outros, está sendo planejada sem debate com a sociedade e sem a transparência do que está sendo passado à iniciativa privada. De acordo com Américo Sampaio, da Rede Nossa São Paulo, o que foi aprovado é um ‘cheque em branco’ dado pela Câmara para o Executivo conceder um conjunto grande de serviços”, completa.
Condução - O pesquisador em mobilidade urbana do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) Rafael Calabria entende que as concessões podem ter utilidade, mas que a condução do processo possui equívocos. “Concessões por tempo limitado são uma forma da prefeitura de gerir os serviços públicos. Elas também devem cumprir critérios de qualidade e universalidade do atendimento”, afirma. O Idec é uma das organizações responsáveis pelo encontro.
“Como o texto omisso do Projeto de Lei 367, como ele foi aprovado, a prefeitura está apenas repassando a responsabilidade da prestação do serviço às empresas, sem cobrar delas critérios claros de qualidade e garantia dos direitos dos usuários. Por exemplo, o serviço do Bilhete Único não prevê diretrizes para a ampliação do atendimento do serviço presencial ao usuário e não detalha a proteção de dados pessoais. Do mesmo modo, a concessão dos terminais não contém diretrizes para a operação dos ônibus, critérios de informação aos usuários nem detalhes de acessibilidade e intermodalidade nas edificações”, completa.
Danielle concorda com Calabria e aponta mais problemas relacionados à tramitação dos projetos. “A condução não está sendo muito participativa. Fizemos a análise de todo o processo. Os trâmites não respeitaram uma série de normativas, como por exemplo, a de passar pela Comissão Técnica de Legislação Urbanística (CTLU) (…) O Executivo praticamente não fez nenhuma conversa com a sociedade. Foi feito apenas depois que já estava no Legislativo, que tem feito audiências, mas com muita confusão”, afirma.
“Inclusive, um vereador da base do Doria, Mario Covas Neto (PSDB), quer impugnar a lei porque ele vê que, de acordo com as normas da Câmara, ela não passou adequadamente pelas comissões. Então, temos problemas. A sociedade não está sendo verdadeiramente escutada. Mesmo a aprovação foi muito confusa, com emendas apresentadas de última hora, sem que a população pudesse analisar. Foi uma votação no meio da noite para que a sociedade não pudesse pressionar e participar. Então, não consideramos um processo legítimo de escuta verdadeira da população sobre esse assunto gravíssimo para a cidade”, conclui Danielle.