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Chapéu
Samba é resistência!

Em desfile histórico, Paraíso do Tuiuti escancara golpe contra trabalhadores

Linha fina
Escola de samba de São Cristóvão, vice-campeã do carnaval carioca em 2018, abordou os 130 anos da Lei Áurea, denunciou escravidão moderna, com críticas às reformas trabalhista e da Previdência, e levou para a Sapucaí Temer “vampiro neoliberalista” e “manifantoches” montados em patos da Fiesp
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Foto: Mídia Ninja

São Paulo – Em entrevista ao Intervozes, o diretor de carnaval da Paraíso do Tuiuti, Thiago Monteiro, resumiu o desfile histórico da escola de São Cristóvão, que garantiu o vice-campeonato do carnaval carioca em 2018, com uma frase: “Nós falamos o que o povo quer”. Quarta escola a entrar na Sapucaí no domingo 11, a Paraíso do Tuiuti levou para a avenida o enredo “Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?”, através do qual abordou os 130 anos da Lei Áurea, denunciou a escravidão moderna, com críticas às reformas trabalhista e da Previdência, e levou para a Sapucaí um Temer “vampiro neoliberalista” e “manifantoches” vestidos de verde e amarelo, uma clara alusão aos protestos a favor do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, eleita democraticamente com 54 milhões de votos.

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No desfile, a escola lembrou a marginalização da população negra que se seguiu após a Lei Áurea, que não trouxe cidadania nem igualdade de direitos para os escravos libertos. 

Em uma das alas (foto abaixo), a Paraíso do Tuiuti trouxe para a Sapucaí manifestantes de verde amarelo, montados em patos da Fiesp. Outra versão dessa fantasia apareceu no último carro alegórico, com manifestantes manipulados por mãos gigantes e batendo panelas. O mesmo carro que trazia uma crítica explícita ao presidente Michel Temer, retratado como um “vampiro neoliberalista” no comando de um novo navio negreiro. 

Foto: Reprodução

Outra ala que teve grande destaque foi a “Guerreiro da CLT”, na qual eram representados trabalhadores tentando se proteger dos ataques à CLT, fantasiados de carteiras de trabalho sujas, rasgadas e queimadas. 

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Premiada com o Estandarte de Ouro, a Comissão de Frente da Paraíso do Tuiuti (foto abaixo), obra de Patrick Carvalho entitulada "O grito de liberdade",arrancou aplausos e lágrimas do público presente na Sapucaí ao retratar a escravidão. 

Foto: Gabriel Nascimento/Riotur

Repercussão – Se como afirmou o seu diretor de carnaval, a intenção da Paraíso do Tuiuti foi “falar o que o povo quer”, a escolha por um enredo e alegorias que trouxessem uma forte crítica social e política sobre os rumos do Brasil, escancarando para o mundo o golpe contra os trabalhadores, não poderia ter sido mais certeira. 

Ao passar pela Sapucaí, a escola foi ovacionada pelo público presente. Após o encerramento do desfile,  já estava no topo dos Trending Topics do Brasil e do mundo no Twitter. Aclamada como sensação do carnaval 2018, a Paraíso do Tuiuti levou o prêmio Escola de Ouro, da 21ª edição do Tamborim do Ouro, premiação promovida pelo jornal O Dia para homenagear os destaques do carnaval. A escola também faturou os troféus de Comissão Sensação e Samba do Ano. Além disso, a Paraíso do Tuiuti figura como a favorita do público em diversas enquetes na internet.

Globo constrangida – Outro fato relacionado ao desfile da Paraíso do Tuiuti que foi amplamente comentado nas redes sociais foi o evidente constrangimento da equipe da Globo ao ter de comentar o enredo da escola de São Cristóvão. A transmissão foi marcada pelo silêncio de Fátima Bernardes, Alex Escobar e Milton Cunha sobre as alusões aos manifestantes pró-impeachment, às reformas trabalhista e da Previdência, e ao presidente Michel Temer. 

Ao final do desfile, a emissora “abafou” na sua transmissão ao vivo os gritos de “fora Temer” que vinham das arquibancadas da Sapucaí. Como ocorre com todas as escolas de samba, a Globo recebeu em seu camarote representantes da Paraíso da Tuiuti, mas nem os “manifantoches” e nem o “vampiro neoliberalista” foram temas das entrevistas. 

Confira abaixo o samba-enredo da Paraíso do Tuiuti

Meu Deus, Meu Deus! Está extinta a escravidão? 

Irmão de olho claro ou da Guiné 
Qual será o seu valor? Pobre artigo de mercado 
Senhor, eu não tenho a sua fé e nem tenho a sua cor 
Tenho sangue avermelhado 
O mesmo que escorre da ferida 
Mostra que a vida se lamenta por nós dois 
Mas falta em seu peito um coração 
Ao me dar a escravidão e um prato de feijão com arroz 

Eu fui mandiga, cambinda, haussá 
Fui um Rei Egbá preso na corrente 
Sofri nos braços de um capataz 
Morri nos canaviais onde se plantava gente 

Ê Calunga, ê! Ê Calunga! 
Preto velho me contou, preto velho me contou 
Onde mora a senhora liberdade 
Não tem ferro nem feitor 

Amparo do Rosário ao negro benedito 
Um grito feito pele do tambor 
Deu no noticiário, com lágrimas escrito 
Um rito, uma luta, um homem de cor... 

E assim quando a lei foi assinada 
Uma lua atordoada assistiu fogos no céu 
Áurea feito o ouro da bandeira 
Fui rezar na cachoeira contra bondade cruel 

Meu Deus! Meu Deus! 
Seu eu chorar não leve a mal 
Pela luz do candeeiro 
Liberte o cativeiro social 

Não sou escravo de nenhum senhor 
Meu Paraíso é meu bastião 
Meu Tuiuti o quilombo da favela 
É sentinela da libertação

 

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