São Paulo – Um grupo de trabalho formado por estudiosos, pesquisadores, estudantes e outros profissionais da área de trabalho divulgou manifesto em que critica as propostas de reforma trabalhista em curso no Congresso. "Somos contra esta agenda precarizante que se esconde por trás de um discurso de modernização e melhoria da competitividade. Na verdade, estas iniciativas retiram direitos, não resolvem o problema do emprego e significam um inaceitável retrocesso social, em um país com índices expressivos de desigualdade", afirmam os integrantes do GT, que se reúne semanalmente no Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Eles citam especificamente os Projetos de Lei 6787, de reforma da legislação trabalhista, 4302 e 30, os dois últimos sobre terceirização. O 4302, de 1998, foi aprovado na quarta 22 pela Câmara dos Deputados. Os signatários do manifesto afirmam que o projeto representa retrocesso "ao estimular as sucessivas subcontratações, ao permitir que todos trabalhadores sejam terceirizados e ao precarizar as relações de trabalho por meio de salários menores e jornadas maiores".
No documento, todos também contestam o argumento recorrente de que as reformas são necessárias para criar postos de trabalho e estimular investimentos. "Como demonstra a experiência brasileira dos anos 1990 e 2000, não há comprovação de que existe uma correlação entre flexibilização de direitos e criação de empregos."
O manifesto será entregue em abril aos deputados e senadores. Leia a íntegra do documento, que pode ser assinado. Até o final da tarde de sexta 24, já tinha mais de 4,2 mil assinaturas.
MANIFESTO CONTRA A REFORMA TRABALHISTA
Sem emprego e sem direitos: uma reforma anti-trabalho
Nós, pesquisadores, estudantes e profissionais da área do trabalho, vimos a público denunciar os retrocessos inaceitáveis contidos nas duas propostas de reforma trabalhista em curso no Congresso Nacional: a prevalência do negociado sobre o legislado (PL 6.787/2016) e a regulamentação da terceirização (PL 4.302/1998 e PLC 30/2015), convidando a todos que com ele concordem a assiná-lo.
O PL 6.787/2016 representa uma mudança profunda no sistema de relações de trabalho brasileiro ao introduzir o princípio de que a lei possa ser rebaixada pela negociação coletiva. O negociado prevalecer sobre o legislado significará que as contratações dos trabalhadores poderão ser em patamares inferiores aos estabelecidos pela legislação, ou seja, com redução de direitos. Os acordos ou as convenções coletivas historicamente têm como objetivo elevar os patamares civilizatórios mínimos expressos na lei, ampliando a tela de proteção social, fortalecendo o instituto da negociação, a representação sindical e os próprios trabalhadores. Ao invés da prometida organização dos trabalhadores no local de trabalho, a regulamentação proposta não garante a participação do sindicato na eleição da representação e gera conflitos de papeis entre a representação na empresa e o sindicato. A possibilidade de renúncia a direitos pela via da flexibilização vai fragmentar a organização dos trabalhadores e a própria ação sindical.
Este projeto limita também a atuação da Justiça do Trabalho ao atribuir à representação sindical o papel de resolver os conflitos trabalhistas na empresa. Desse modo, constitui um claro ataque a essa instituição, ao Ministério Público do Trabalho e, em especial, ao Direito do Trabalho, em visível restrição inconstitucional.
A segunda proposta trata da regulamentação da terceirização. O resgate da PL 4.302/1998, legado do governo FHC, retira todos os limites à terceirização, liberando-a para todos os níveis e atividades. Sua aprovação será um retrocesso ao estimular as sucessivas subcontratações, ao permitir que todos trabalhadores sejam terceirizados e ao precarizar as relações de trabalho por meio de salários menores e jornadas maiores.
Os argumentos de que a reforma trabalhista é necessária para gerar empregos e estimular investimentos produtivos não se sustentam quando confrontados com a realidade. Como demonstra a experiência brasileira dos anos 1990 e 2000, não há comprovação de que existe uma correlação entre flexibilização de direitos e criação de empregos. Os estudos mais recentes dos organismos internacionais, especialmente da OIT (World Employmentand Social Outlook 2015), também apontam que não há significância estatística entre uma legislação trabalhista flexível e a geração de emprego. Ao contrário: em países onde a desregulamentação cresceu, o nível de desemprego aumentou; e em países em que a regulamentação se intensificou, as taxas de desemprego caíram no longo prazo.
Face às alterações já realizadas e à elevada taxa de rotatividade do mercado de trabalho não é possível caracterizar como ultrapassada e rígida a legislação trabalhista no Brasil. Não há nenhuma restrição de parte das empresas em promover demissões imotivadas: somente em 2016 foram desligados 16.060 milhões de trabalhadores e admitidos 14.738 milhões. Aumentar a flexibilidade dos contratos de trabalho e reduzir direitos, além de não gerar empregos, rebaixam os salários e reduzem o poder de compra, reforçando a atual tendência recessiva da economia.
A existência de instituições que asseguram proteção aos trabalhadores é importante para resolver as controvérsias e garantir a efetivação dos direitos, em um país com um histórico de desrespeito às leis trabalhistas. As propostas e os ataques às instituições públicas e aos sindicatos podem fragilizar os instrumentos para assegurar a proteção, o combate à desigualdade e a garantia da dignidade humana. A segurança jurídica pleiteada pelas empresas com as propostas de fragilização das instituições vai significar insegurança para os trabalhadores e para sociedade, disseminando-se a lei do mais forte.
Somos contra esta agenda precarizante que se esconde por trás de um discurso de modernização e melhoria da competitividade. Na verdade, estas iniciativas retiram direitos, não resolvem o problema do emprego e significam um inaceitável retrocesso social, em um país com índices expressivos de desigualdade.
Adalberto Moreira Cardoso, professor e pesquisador IESP/UERJ
Adílson Araújo, presidente da CTB
Ana Luíza Matos de Oliveira, doutoranda IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Ana Paula Alvarenga Martins, juíza do Trabalho
Ângelo Araújo, IFCH/Unicamp
Armando Boito Jr, Professsor Ciência Política/Unicamp
Bárbara Vallejos Vazquez, mestranda IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Carlos Eduardo Oliveira Dias, juiz do Trabalho
Carlos Eduardo Silveira, economista e ex-diretor do Ipea
Caroline Proner, professora de Direito Internacional da FND-UFRJ
Davisson Charles Cangussu de Souza, professor do Curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp/Guarulhos)
Denis Maracci Gimenez, diretor Cesit/Unicamp
Edevaldo de Medeiros, juiz federal
Eduardo Costa Pinto, professor IE/UFRJ
Eleonora Coca, desembargadora do Trabalho
Eliana Pessanha, professora IFCS/UFRJ
Euzébio Jorge da Silveira, doutorando IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Fabio Campos, professor IE/Unicamp
Graça Costa, secretária de Relações do Trabalho da CUT Nacional
Graça Druk, professora Titular Sociologia UFBA
Hugo Cavalcanti de Melo Filho, juiz do Trabalho e presidente da ALJT
Ione S. Gonçalves, desembargadora aposentada TRT4 e advogada trabalhista
Iracema Soares, UFSC
Jorge Abrahão de Castro, pesquisador do IPEA
Jorge Luís Souto Maior, juiz do Trabalho e professor da FD-USP
José Celso Cardoso Jr, pesquisador do IPEA
José Dari Krein, pesquisador e professor do Cesit/IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
José Ricardo Ramalho, professor IFCS/UFRJ
José Roberto Heloani, Faculdade de Educação/Unicamp
Juliana Duffles D Moreira, Doutoranda IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Juliane Furno, doutoranda IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Lays Cristina de Cunto, juíza do Trabalho
Lisyane Chaves Motta, procuradora do Ministério Público do Trabalho
Luiz Gonzaga Belluzzo, professor IE/Unicamp
Magda Barros Biavaschi, desembargadora aposentada do TRT, pesquisadora do Cesit/IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Marcelo Gherini, mestrando IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Marcelo Weishaupt Proni, pesquisador do Cesit/IE/Unicamp
Márcia Leite, professora titular da Faculdade de Educação - Unicamp
Marcio Pochmann, pesquisador e professor do Cesit/IE/Unicamp
Marco Antonio Rocha, docente IE-Unicamp
Marcus Barberino, juiz do Trabalho
Marilane Oliveira Teixeira, economista IE/Unicamp
Mateus Santana, mestrando IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Miguel Rossetto, sociólogo, ex-ministro do MDA e ex-ministro do Trabalho e Emprego
Milton Pinheiro, professor de Programa de História, Cultura e Práticas Sociais da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
Pablo Souza Rocha, juiz do Trabalho
Patrícia Maeda, juíza do Trabalho
Paulo Baltar, pesquisador do Cesit e ex-diretor do IE/Unicamp
Paulo Fontes, FGV/CPDOC
Pedro Henrique Alcântara, mestrando IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Pedro Rossi, professor do IE/Unicamp
Pietro Borsari, mestrando IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Raquel Guimarães, professora UFPR
Renata Nóbrega, juíza do Trabalho
Ricardo Antunes, professor titular do Departamento de Sociologia/Unicamp
Roberto Veras, pesquisador Trabalho e professor da UFPB
Rosaly Stange Azevedo, juíza do Trabalho
Roselene Aparecida Taveira, juíza do Trabalho
Rosilene Taveira, juíza do Trabalho
Sergio Batalha Mendes, advogado trabalhista e diretor do Sindicato dos Advogados do Estado do Rio de Janeiro
Sílvia Burmeister, ex-presidente da Abrat
Silvia Mourão, Advogada Trabalhista
Sofia Lima Dutra, juíza do Trabalho
Tomás Rigoleto, doutorando IE/Unicamp e membro do GT Reforma Trabalhista Cesit-IE/Unicamp
Vítor Filgueiras, auditor fiscal do Trabalho
Waldeck Carneiro, professor da Faculdade de Educação da UFF
Waldir Quadros, professor IE/Unicamp
Wilson Cano, professor IE/Unicamp