“A população está sofrendo. Tem mais de um mês que começou o plano de imunização, e só por volta de 3% da população foi vacinada. Então não há perspectiva de ter a vacina. É um governo que tem métodos fascistas, não na concepção de defesa do patrimônio nacional, do nacionalismo, mas um governo de métodos fascistas, de eleger inimigos imaginários. Ele ataca a ciência, ataca a educação, ataca a cultura, ataca tudo que signifique consciência crítica, e desconstrói a participação popular.”
A avaliação da gestão Bolsonaro foi feita pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF) nesta segunda-feira 1º, em um debate virtual com dirigentes do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.
Segundo Kokay, Bolsonaro tem colocado em prática o método de testar as instituições e, se houver espaço, aprofundar os ataques à democracia. Um destes métodos é a militarização do governo. Ela destacou que o orçamento das Forças Armadas é de R$ 110 bilhões, enquanto o da Educação é de R$ 115 bilhões.
“Lembram dos 700 [mil] quilos de picanha, do leite condensado, da batata frita, do chiclete, da cerveja? Ele busca manter apoio do segmento armado e, ao mesmo tempo, armar o seu próprio segmento. A política de combate ao desarmamento vai favorecer fundamentalmente as milícias. O trabalhador não vai ter dinheiro para comprar uma arma, se ele não tem nem o que comer. Quem vai se armar, com esse nível de desemprego, são as milícias”, afirmou a deputada, acrescentando que existem dois projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional que restringem o poder de governadores sobre os braços armados dos Estados e do Distrito Federal.
As propostas trazem mudanças na estrutura das polícias, como a criação da patente de general, hoje exclusiva das Forças Armadas, para PMs, e de um Conselho Nacional de Polícia Civil ligado à União.
“Bolsonaro afaga as Forças Armadas e quer fazer com que as polícias militares sejam de responsabilidade da União, e não dos Estados e, ao mesmo tempo, vai testando as instituições. Se as instituições não respondem, ele avança”, afirma Kokay.
Reforçar a organização popular e buscar unidade da esquerda
Segundo a deputada, são indícios conistentes de que Bolsonaro tentará uma resistência armada se perder as eleições. “Ele vai questionar [o resultado, caso perca], mas está buscando as condições para questionar de forma armada. Portanto é o momento de reforçar a organização popular, de buscar unidade dos partidos de esquerda e de buscar a se contrapor a todo este negacionismo”, afimou Erika.
Para a deputada, Bolsonaro não apenas nega a ciência com a questão da vacinas, mas ele busca reconstruir a realidade a partir dos seus próprios pensamentos.
“É uma pós-verdade reproduzida nos púlpitos das igrejas, e nas redes sociais, com as fake news. Quando se constrói uma realidade que é na medida do que você pensa, não se admite qualquer tipo de discussão. É uma nova realidade em curso. É uma campanha que foi pautada no ódio. O ódio é muito construído em função de uma cultura do medo: medo de que o filho mude de sexo, medo de que a família se desconstrua, medo de que você leve um tiro, medo da violência. A cultura do medo possibilita a aceitação mais tranquila do próprio arbítrio. Nós estamos vivenciando uma cultura do medo que é uma cultura do ódio e da mentira.”
Fundamentalismo e mercado: agendas cruéis para o povo
Para além dos métodos de perpetuação do poder que estão sendo observados, Erika avalia que Bolsonaro é refém de duas agendas avaliadas por ela como cruéis para o povo brasileiro. Uma delas é a do fundamentalismo obscurantista, representado pelo eleitorado fiel ao Bolsonaro, e que se unifica em três tipos: o religioso, que tem sua própria verdade e quer romper o caráter laico do país; o punitivista, que acha que os problemas do país se resolvem com armas e com encarceramento, não importando se o Brasil é a terceira maior população carcerária do mundo; e o o patrimonialista, representado pelos ruralistas que acham que o país se resume a um imenso latifúndio voltado para o agronegócio de exportação.
A segunda agenda é a do mercado. “É como se o mercado fosse um deus enfurecido, que, como nas grandes tragédias gregas (...), quando se enfurece, é preciso jogar um corpo em sacrifício para aplacar sua fúria”, comparou Erika.
“Se ele diz que é contra a política [internacional] de preços [do petróleo], e por isso vai mudar o presidente da Petrobras, mas nao vai mudar a política de preços, ele reconhece que é uma sinalização para poder dar uma reposta à própria sociedade sem qualquer tipo de eficácia. Ele diz que é preciso dar cartão vermelho para o secretário da economia [Waldery Rodrigues Júnior, secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia], mas o secretário está até hoje lá, com cartão vermelho. Diz que vai ser contra a reestruturação do Banco do Brasil, mas o presidente do banco e os representantes do Bolsonaro no conselho de administração aprovam esta mesma mudança. Ou seja, ele vai ficar refém do mercado, e todas as vezes que essa relação estremece, ele vai ter que dar sinalizações para o mercado.”
Estado mínimo e o crime da privatização da Eletrobras
A deputada alertou que a priorização do governo para a privatização da Eletrobras e dos Correios está neste mesmo sentido.
“É um crime contra o país privatizar a Eletrobrás. Eles querem vender por R$ 16 bilhões uma empresa que deu R$ 30 bilhões de lucro nos últimos três anos. É uma empresa que representa a soberania energética. Quase 70% das hidrelétricas estadunidenses estão protegidas pelo exército, mas as da Eletrobras serão vendidas para uma empresa de um país que seguramente não vende as suas hidrelétricas, porque hidrelétricas significam soberania energética. E vender hidrelétrica significa vender também o subsolo, também vender a vazão dos rios, também é vender as matas ciliares. É vender para além da própria hidrelétrica”, afirmou.
Ainda segundo a deputada, Bolsonaro está fazendo um jogo de ameaça ao tentar condicionar a volta do auxílio-emergencial em troca de um recrudescimento das iniciativas do estado mínimo para a população, e máximo para o capital financeiro, que será visto no Orçamento; com a Proposta de Emenda à Constituição emergencial, que propõe o fim do piso para a Saúde e a Educação; e na reforma administrativa, que irá enfraquecer o serviço público.
Capitalismo improdutivo
Erika avaliou que o modelo econômico atual é focado na acumulação do capital, por meio do capitalismo improdutivo e da acumulação de renda. “Estamos vivendo um decréscimo do papel da indústria no PIB, que já chegou a ser de 30% e hoje é de 10%. E o Brasil vivencia um momento em que o capitalismo não tem relação com o trabalho. A gente vive um desemprego estrutural e não circunstancial”, disse a deputada.
“É um capitalismo sem compromisso com a infraestrutura para escoamento da produção, porque não produz; sem compromisso de criar um mercado interno, portanto não é necessário ter renda para o conjunto da população; não precisa de crédito para a produção, porque está apartado da própria produção. O setor que acumula hoje o capital no Brasil não precisa das estatais para poder sobreviver. Então o que há é uma política de desestatização em curso, e um domínio do mercado representado pelo próprio [ministro da Economia] Paulo Guedes.”