O tema “Resistência ao Desmonte – Não ao Retrocesso”, balizou, na quinta 1º, um dos debates do 35º Congresso Nacional dos Empregados da Caixa, em São Paulo. O segundo painel do evento abordou questões como a defesa da Caixa 100% pública, a fragilização e descarte dos direitos trabalhistas conquistados, além da ótica da privatização da equipe econômica do atual governo.
A ex-presidenta da Caixa, Maria Fernanda Ramos Coelho, o assessor Jurídico da CUT, José Eymard Loguércio, e a assessora jurídica da Fenae, Laís Carrano foram os palestrantes que conduziram o debate, com um público composto por mais de 300 participantes.
> “Este congresso tem cheiro de resistência”, afirmou Erika Kokay
> Previdência e Saúde marcam o início dos debates do 35º Conecef
> 21ª Conferência Nacional dos Bancários inicia na noite de sexta 2 e vai até domingo 4
Primeira mulher a presidir o banco público, Maria Fernanda começou sua palestra citando o livro “Guerras híbridas: das revoluções coloridas ao golpe”, de Andrew Korybko. Dentre outros conceitos tratados na obra, o autor descreve como as ocupações militares dão lugar a golpes. Nessa temática, Maria Fernanda falou sobre a fragilização do direito do trabalhador e a necessidade das pessoas imporem uma nova visão de mundo.
Segundo a ex-presidenta da Caixa, atualmente a forma de organização hegemônica é tida como a única forma de compreender a organização de vida. “Se muitos de nós participamos de cargos de gestão dos outros governos, somos eliminados da Caixa, independendo da competência ou capacidade”, pontuou.
Para ela, o processo de privatização está em curso e faz parte do projeto de governo e, no caso da Caixa, os principais alvos são as loterias, FGTS, cartões e seguros. “Fatiamento, privatização e abertura de capital, esse é o projeto deles. Qual é o futuro da Caixa pública?”, questionou.
Diante do cenário apresentado pela ex-presidente da Caixa, o grande desafio é construir uma estratégia comum com novas formas de comunicação, valores como solidariedade, tolerância, direito à memória, transparência, auto responsabilidade porque todos precisam de uma Caixa pública.
“É a Caixa que fomenta o desenvolvimento, e nós precisamos dela porque o Brasil é desigual. A reponsabilidade não é só do outro, do partido ou do parlamentar, a responsabilidade é minha como cidadã. Porque na hora que enclausura a grande voz de defesa do trabalhador, a gente que tem que falar”, cravou Maria Fernanda.
“Sindicatos na mira”
Tendo como pano de fundo uma análise política e social aprofundada sobre a história dos direitos do trabalhador no Brasil, o assessor Jurídico da Cut, José Eymard Longuércio, traçou um panorama histórico da implementação da legislação trabalhista no Brasil, como ela refletiu no desenvolvimento industrial, até a precarização dos contratos de trabalho, com as novas legislações.
Longuércio lembrou de alguns momentos vividos pelos trabalhadores, ao longo dos tempos, como a expectativa da construção de uma democracia inclusiva e participativa, passando pela interrupção da democracia na ditadura até a redemocratização com a Constituição de 1988.
“Atualmente, as normas de segurança do trabalho estão sendo desregulamentadas, também do ponto de vista da organização sindical. “Se o trabalho não será mais o centro, o sindicato também não será”, disse.
No entanto, para o advogado, o contexto atual é muito grave porque as ameaças de privatização das empresas públicas chegam mais fortes do que na década de 90.
“Agora estão na mira exatamente aquelas entidades que tem algum tipo de vinculação com os direitos sociais. Aquelas que tem uma vocação social do ponto de vista dos trabalhadores mais pobres, da educação, do saneamento, da educação e do nosso bem-estar como cidadão. Estão mais na mira do que nos anos 90 e nos anos passados”, concluiu.
O desmonte do sistema de proteção do trabalho
A reforma trabalhista (lei 13.467/2017) e a Lei da Terceirização (lei 13.429/2017) trouxeram novas regras ao mercado de trabalho que até hoje são marcadas pela falta de clareza e por perdas de direitos significativos aos trabalhadores. Se por um lado, foram sancionadas com o objetivo modernizar e desburocratizar o mercado de trabalho, após dois anos em vigor, promoveram uma importante perda de direitos aos trabalhadores.
Ao fazer uma análise sobre as condições e direitos do mercado de trabalho nos últimos dois anos, a assessora Jurídica da Fenae, Laís Carrano, reforçou como o teletrabalho, o home office e outras regras impostas pela lei da terceirização e reforma trabalhista refletem nos danos, riscos e perdas de direitos implicadas nestes novos modelos de trabalho.
“O meu questionamento é: qual é o futuro do trabalho? O direito sempre é o irmão mais lento, a sociedade constrói as regras e o direito só chega depois para regular”, definiu Laís Carrano.
Ao lembrar que muitos profissionais de Tecnologia da Informação (TI) que atuam na Caixa já trabalham no modelo homeoffice, a advogada citou um exemplo sobre a responsabilidade pela infraestrutura necessária para a realização do trabalho. Segundo a assessora jurídica da Fenae, pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) não fica claro de quem é a responsabilidade. O RH da Caixa diz que cabe ao empregado providenciar toda a infraestrutura no seu local de trabalho, além de garantir e se responsabilizar para que não ocorram acidentes de trabalho.
“Isso significa que ele precisa não apenas de um computador, mas que ele precisa de toda a ergometria da sua nova estação de trabalho. Agora, cabe ao empregado pagar e custear essa nova estrutura? Ou seja, o custo sai da empresa e quem paga para trabalhar passa a ser o empregado?”, questionou.
Laís Carrano destacou ainda que já há estudos do alto índice de adoecimento mental e físico dos empregados e o empregador precisa se responsabilizar pela saúde dos trabalhadores. “O trabalhador não é uma ferramenta de consumo, ele é um ser vivo. E infelizmente o que se impõe mais pelas medidas provisórias que foram apresentadas, o trabalhador é descartado. “E as reformas, tanto trabalhista como da previdência, cada vez mais reafirmam o descarte do ser humano, sem garantias e sem direitos. E aí eu questiono: qual será o futuro do trabalho? Quais direitos vamos construir?”, questionou.