São Paulo - O Supremo Tribunal Federal (STF) já recebeu, até esta segunda-feira 23, três ações questionando a constitucionalidade da Portaria 1.129, do Ministério do Trabalho, que alterou a conceituação de trabalho escravo e dificulta a fiscalização desse tipo de crime.
A mais recente é uma Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) protocolada na mesma segunda 23 pelo PDT. Antes, a Rede Sustentabilidade já havia ajuizado Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), pedindo liminar para suspender os efeitos da portaria, bem como a Confederação Nacional das Profissões Liberais.
As três serão relatadas pela ministra Rosa Weber, que deve pedir ao Ministério do Trabalho e à Procuradoria-Geral da República (PGR) que se manifestem nos processos, antes de decidir sobre o assunto.
Contestações - As três ações são semelhantes em seu mérito e argumentam que a portaria viola princípios fundamentais da Constituição, como o da dignidade humana, bem como vai contra tratados internacionais e a própria legislação brasileira sobre o tema.
Entendem que na prática, a norma faz com que seja preciso condição semelhante à escravidão colonial para que se caracterize o trabalho escravo contemporâneo. Isso porque a portaria acrescenta a restrição da liberdade de ir e vir do empregado como condição para que a jornada de trabalho possa ser enquadrada como exaustiva, embora tal condicionante não esteja prevista no artigo 149 do Código Penal, que trata das condições análogas à de escravo.
Há, ainda, contestações contra a criação de entraves burocráticos e políticos para a atuação de fiscais e o afastamento de requisitos mínimos para a celebração de Termos de Ajustamento de Conduta sobre a matéria.
A Rede afirma que o ato normativo foi editado “com o falso pretexto de regular a percepção de seguro desemprego por trabalhadores submetidos a condição análoga à escravidão”. Acrescenta que, apesar de legalmente abolida há quase 130 anos no país, a escravidão ainda é praticada por meio de “formas contemporâneas”, sobretudo no meio rural.
Grita geral - Segundo a Portaria 1.129, publicada no Diário Oficial da União (DOU) de segunda 16, para que a jornada excessiva ou a condição degradante sejam caracterizadas é preciso haver a restrição de liberdade do trabalhador, o que contraria o artigo 149 do Código Penal. O artigo estabelece que o trabalho análogo ao de escravo se caracteriza pela sujeição a condições degradantes, jornadas exaustivas, trabalho forçado e servidão por dívida. O flagrante de qualquer um desses elementos é suficiente para configurar o crime.
A portaria também restringe a divulgação da lista suja. Antes, ela era obrigatoriamente divulgada a cada seis meses com nomes de todos os empregadores infratores flagrados e cujos autos de infração já tivessem esgotado os recursos. Agora caberá ao ministro do Trabalho autorizar a inclusão dos nomes dos infratores e decidir sobre a divulgação.
Diante da, na prática, 'liberação' do trabalho escravo por Temer, a grita foi geral. Organização Internacional do Trabalho, ligada à ONU, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Conselho Nacional de Justiça, Defensoria Pública da União e Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente foram algumas das entidades que reagiram contra a norma.
A CUT, junto com as demais centrais sindicais brasileiras, afirmaram que a medida de Temer atende a interesses espúrios.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também se manifestou afirmando diretamente para o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, que a portaria "volta a um ponto que a legislação superou há vários anos.”