A Marcha da Consciência Negra 2020, realizada na última sexta 20 (Dia da Consciência Negra), foi histórica. Mesmo em um cenário de pandemia e debaixo de chuva, os manifestantes mostraram muita revolta e disposição para a luta contra o racismo estrutural e suas diversas manifestações de violência, que oprimem e matam negros e negras no Brasil.
O Sindicato, assim como a CUT, esteve representado na marcha por diversos de seus dirigentes.
“Tudo o que todos os anos levamos para a rua para conscientizar trabalhadores estava latente. O racismo mata de forma brutal e está enraizado na estrutura das instituições. É preciso parar de negar, é preciso parar de crer que são casos isolados, é preciso se levantar contra essa violência brutal. É por isso que o Sindicato vai todos os anos para a rua, junto com a CUT e outros movimentos. É por isso que o Sindicato chama a Fenaban para negociar e cobra a contratação de mais negros e negras. É por por isso que fizemos uma série de vídeos relembrando cenas de racismo estrutural. Para lembrar, sempre, todos os dias, que precisamos ser contra o racismo e ter uma atitude antirracista”, diz Fábio Pereira, coordenador do Coletivo de Combate ao Racismo do Sindicato.
Beto, presente!
A edição deste ano da Marcha da Consciência Negra foi fortemente marcada pela indignação e revolta contra o assassinato brutal de João Alberto Silveira Freitas, um homem negro de 40 anos, por seguranças de uma unidade do supermercado Carrefour em Porto Alegre. O crime bárbaro aconteceu na véspera do Dia da Consciência Negra, e as imagens viralizaram na internet.
Ao chegar à rua Pamplona, em frente a uma unidade do Carrefour, de forma espontânea um grupo de manifestantes adentrou o estabelecimento e expressou sua revolta destruindo gôndolas e causando um princípio de incêndio. Ninguém ficou ferido na ação.
“O que houve durante a marcha e a ação no Carrefour, a ocupação e a ação direta, não foi articulada ou combinada. Foi ação espontânea de parte dos que estavam na marcha, pessoas negras e brancas revoltadas, indignadas, e com toda razão (…) O que são vidraças e prateleiras diante do sofrimento de uma família, filhos, esposa, mãe, que perde o pai, o marido o filho, por conta da violência racial?”, disse em entrevista ao jornalista Igor Carvalho, do Brasil de Fato, Douglas Belchior, fundador da Uneafro e da Coalizão Negra por Direitos.
Da Marcha para a bolsa de valores
O assassinato de Beto, assim como a reação do movimento negro e de grande parcela da sociedade, o que inclui os eventos da Marcha da Consciência Negra na capital paulista, ganharam destaque na mídia brasileira e em todo o mundo, impactando diretamente nas ações do Carrefour. Na segunda-feira 23, as ações do Carrefour Brasil fecharam em queda de 5,3%, o pior desempenho entre os papéis do Ibovespa, equivalente a uma perda em valor de mercado de R$ 2,16 bilhões. Em Paris, as ações do Grupo Carrefour encerraram o dia em queda de 2,21%.
Por sua vez, o presidente global do Grupo Carrefour, Alexandre Bompard, se pronunciou dizendo que a morte de João Alberto Silveira Freitas foi um "ato horrível" e que repudia a intolerância, afirmando ainda que será realizada “uma revisão completa das ações de treinamento dos colaboradores e de terceiros, no que diz respeito à segurança, respeito à diversidade e dos valores de respeito e repúdio à intolerância”. No Brasil, o Carrefour divulgou nota dizendo que o dia 20 de novembro foi "o mais triste da história" da empresa e anunciando que todo o resultado das vendas do último dia 20 será doado para entidades ligadas à luta pela consciência negra, além da criação de um fundo de combate ao racismo, com aporte inicial de R$ 25 milhões.
“É importante perceber que a indignação e a revolta da sociedade contra o racismo traz consequências reais para os racistas e para empresas e instituições que compactuam, se omitem ou reproduzem o racismo, de forma direta ou indireta. Porém, notas como as do Carrefour, ou mesmo as ações anunciadas após a repercussão do assassinato do Beto, não são suficientes. É preciso que empresas e instituições se comprometam de fato com o combate ao racismo. Isso passa por uma análise minuciosa de suas cadeias produtivas, fornecedores, terceirizados, adoção de políticas afirmativas, e sobretudo colocar o respeito aos direitos humanos como valor inegociável, acima de qualquer outra coisa, inclusive do lucro”, enfatiza a secretária-geral do Sindicato, Neiva Ribeiro.
Uma luta de todos
“Lamentamos a postura de autoridades federais, que negam a existência do racismo e suas consequências para a sociedade brasileira. O Sindicato, em campo oposto ao governo federal, reafirmou mais uma vez sua postura antiracista na Marcha da Consciência Negra. Esta é uma bandeira de luta do Sindicato, seja nas negociações com os bancos ou na sua atuação cidadã, nas ruas e nas redes. Essa luta continua, não fica somente no Dia da Consciência Negra. Ela é urgente, permanente, até que extirpemos o último traço de racismo da nossa sociedade. É uma luta de todos”, conclui Neiva.