São Paulo - O último golpe nos direitos trabalhistas foi desferido pelo seu carrasco: Michel Temer, um verdadeiro capitão do mato dos banqueiros e maus empresários. Na quinta 13, o ilegítimo alçado à presidência por meio de um golpe sancionou o PLC 38, a chamada reforma trabalhista, que na prática é um completo desmonte da Consolidação das Leis do Trabalho. Após ser publicado no Diário Oficial, o que deve ocorrer nos próximos dias, a agora nova lei entra em vigor em 120 dias.
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Temer, o grande testa-de-ferro do desmonte idealizado pelo mercado e por banqueiros, inicialmente queria empurrar a reforma por Medida Provisória. Acabou recuando e enviou a reforma por meio de projeto de lei do executivo. Apresentada em uma cerimônia com pompa e circunstância – e a alardeada presença do presidente da Fiesp, Paulo Skaff – em 22 de dezembro de 2016, “um belíssimo presente de Natal” para os brasileiros, disse na ocasião.
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O projeto anunciado veio pronto para ser aprovado, já estabelecendo, por exemplo, que acordos ou convenções coletivas passariam a ter força de lei, mesmo quando inferiores a ela. O chamado negociado sobre o legislado coloca em risco férias, jornada de trabalho, intervalos de intrajornada, plano de cargos e salários, banco de horas, entre outros.
Durante todo o trâmite, seja na Câmara ou no Senado, não faltaram pressão e movimentação de Temer para que os parlamentares votassem exatamente da forma como ele queria. Não foram aceitas quaisquer emendas. Perdões e renegociações de dívidas foram negociados em troca de votos a favor da reforma, socorro a estados endividados e ameaças. "Se participa com cargos, deve estar com o governo na festa e na tristeza", disse um aliado no final de abril.
Na Câmara, os termos da proposta ficaram definidos pelo substitutivo do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) para o PL 6.787 que mexeu em 104 artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entre modificações, exclusões e adições. Levantamento feito pelo site The Intercept Brasil descobriu que 35% das alterações "foram integralmente redigidas em computadores de representantes" da Confederação Nacional do Transporte (CNT), da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF, leia-se banqueiros), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística).
Uma matéria dessa magnitude, que interfere na vida de praticamente todos os brasileiros, não mereceu tempo para discussão entre os deputados. O governo impôs regime de urgência por meio de uma manobra de bastidor do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) – até então o maior apoiador político de Temer – que havia declarado sem pestanejar, logo após ser eleito, que a agenda da Câmara era a agenda do mercado e que a Justiça trabalhista "nem deveria existir".
A manobra de Maia, na noite de 19 de abril, aprovou o regime de urgência um dia depois de ser rejeitado pelo mesmo plenário. Em apenas algumas horas, dezenas de deputados mudaram o voto por pressão de ministros que compunham a base do governo, sobretudo do PSB, segundo apuração do analista político do Diap Neuriberg Dias.
Alguns dias mais tarde, em 26 de abril, a aprovação da reforma pelos deputados foi sacramentada por 296 votos a 177, não sem antes o plenário rejeitar dois requerimentos da oposição pedindo o adiamento para aprofundamento de debates.
O texto aprovado pela Câmara chegou sem demora ao Senado, no dia 2 de maio, e virou PLC 38. Lá, a base governista de Temer também definiu rápido o rito de discussão do texto original e das centenas de emendas: parcos 30 dias para serem relatados, debatidos e votados em três comissões, além do plenário. Três comissões por pressão da oposição, já que o senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder de Temer na Casa, queria reduzir os debates a duas comissões de menor expressão.
O interesse do governo em aprovar a reforma exatamente como os 'patrões' queriam ficou clara em sessão no plenário do Senado sobre o tema, em meados de maio, que contou com a presença do secretário-geral da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Sérgio Nobre. Na ocasião, o ministro do Trabalho e Previdência Social, Ronaldo Nogueira, preferiu deixar a audiência, evitando ser questionado, logo após as falas protocolares de abertura. Chegou-se a cogitar a participação de um representante do ministério, rechaçada pelos senadores. "É um desrespeito com este Senado. Que deixe a cadeira vazia", exigiu Lindbergh Farias (PT-RJ).
O último movimento de Temer para aprovar a reforma trabalhista da forma como banqueiros e empresários exigiram foi prometer a edição de uma Medida Provisória corrigindo pontos do projeto severamente criticados pelos senadores da oposição e que ameaçavam a aprovação rápida, como a permissão para o trabalho de gestantes e lactantes em ambientes insalubres. Caso algum desses pontos fosse alterado, o texto voltaria a tramitar na Câmara, então Temer, já desgastado por denúncia de corrupção formal da Procuradoria-Geral da República, prometeu editar a MP acertando pontos em desacordo.
Na noite de 11 de julho o plenário do Senado aprovou a reforma por 50 votos a 26. A promessa da MP não durou mais do que alguns minutos, já que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) afirmou, ainda na mesma noite, que não ia colocar nenhuma medida para ser apreciada.
Sendo assim, e sem mudanças que desagradassem os fiadores de seu mandato, Temer recebeu de volta seu projeto, já devidamente aprovado graças à sua tropa de choque, para com uma caneta transformá-lo em lei e acabar com os direitos trabalhistas. E assim o fez, aplaudido pelo seu ministro da Fazenda, o banqueiro Henrique Meirelles, que inclusive discursou.
"Esse projeto é a revelação de como esse governo age", resumiu, durante a cerimônia de assinatura, o presidente que não tem o crivo do povo para exercer o mandato, só do patronato brasileiro.