Atualmente, o Brasil e o mundo atravessam um período de forte avanço do conservadorismo, que ameaça o conceito de direitos humanos e relativiza práticas condenáveis como, por exemplo, racismo, misoginia, xenofobia e elitismo. Em meio a essa dura conjuntura, os movimentos feminista e de mulheres ganham cada vez mais destaque como fronts de enfrentamento aos retrocessos propostos pela extrema-direita.
A grande Marcha das Mulheres em Washington, realizada em 2017, contra Donald Trump e seu sexismo; os atos #EleNão no Brasil; e o movimento “Ni una a menos” contra o feminicídio, surgido na Argentina e que se espalhou pela América Latina; são exemplos do protagonismo político e social cada vez maior das mulheres.
“O movimento feminista (ou de mulheres) tem se colocado o desafio de ser vanguarda no enfrentamento ao fascismo – nas ruas e também nas urnas. Foi o movimento de mulheres que chamou atos por todo o país, entendendo que era preciso organizar algo além da campanha eleitoral – e algo que também fosse para além das redes sociais”, enfatizou a militante feminista Maria Júlia Montero em artigo publicado no Blog da Marcha Mundial das Mulheres.
“A história é feita de ciclos e agora é um momento áureo do conservadorismo em todas as áreas. Os preconceitos afloraram com muito mais intensidade agora, se compararmos com o pós-guerra, quando um sentimento de solidariedade foi necessário para a reconstrução dos países destruídos. Uma parcela das sociedades, independentemente da época, é conservadora, não aceita o outro, o diferente. Mas agora parece que estamos vivendo um retorno aos valores de profundas diferenças de classe, como antes da vitória da burguesia sobre a aristocracia. As diferenças valorativas estão explícitas e se não trabalharmos para regimes políticos e sociedades mais tolerantes e democráticas, vamos retrocedendo. Esperamos que o feminismo ajude a construir maior universalismo e solidariedade nas relações humanas”, disse em entrevista à Revista Cult a professora de Ciência Política na Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisa de Opinião Pública da Unicamp, Lúcia Avelar.
Para Tânia Swain, fundadora na UnB do primeiro programa de pós-graduação em estudos feministas do Brasil, o ativismo das mulheres nas redes sociais já pode ser considerado uma "quarta onda" feminista, antecedida pela convenção dos direitos da mulher de Nova York em 1848 (1ª onda), pelo movimento estudantil francês de 1968 (2ª onda), e a incorporação de outras pautas identitárias que se relacionam com a luta feminista, na década de 1990, como os movimentos negro e LGBT (3ª onda).
"Esse ativismo faz parte da resistência e reivindicação das mulheres e das jovens que se rebelam contra as violências cotidianas. É uma manifestação de repúdio contra a tendência dos homens de considerar que todas as mulheres são pasto para seus desejos. Isto é algo de grande importância, pois a maioria das meninas são ensinadas a não revidar, a não fazer escândalo, a não dizer não", afirmou a pesquisadora à Deutsche Welle, empresa de comunicação internacional da Alemanha.
Feminismo e luta antirracista
De acordo com Liliane Oliveira, diretora de mulheres da UNE (União Nacional dos Estudantes) e militante da Marcha Mundial das Mulheres na Bahia, a luta do movimento feminista e de mulheres tem de ser também, obrigatoriamente, antirracista.
“A discriminação racial é um dos pilares das desigualdades do país e ainda persiste a divisão da sociedade entre a ´Casa Grande` e a `Senzala´, o `sinhôzinho´ e a ´mucama´, a falsa democracia racial que estrutura privilégios de uma pequena parcela em detrimento da maioria absoluta da população. O racismo é estruturante na sociedade capitalista e patriarcal e, no processo de histórico de construção da nação brasileira, o povo negro sempre esteve às margens da sociedade, colocado no centro de teorias higienistas que ainda prevalecem, a exemplo das ações de criminalização da pobreza e genocídio da juventude negra. (...) As lutas feministas e antirracistas contribuem de forma decisiva para a alteração dessas relações de poder e construção de igualdade”, afirma em artigo publicado no blog da Marcha Mundial de Mulheres.
Novembro da Resistência
As lutas das mulheres e negros, lembradas no Dia da Consciência Negra (20) e no Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher (25), são homenageadas pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região com o Novembro da Resistência.
> Sindicato Cidadão promove Novembro da Resistência
“Ao contrário do que muitos pensam, o movimento feminista não é contra os homens, não quer eliminá-los, e nem inverter a situação de opressão, violência e desigualdade em que a sociedade machista tenta manter as mulheres. É um movimento por igualdade de direitos e quando mais avança esse movimento, mas avança a humanidade. Ele se relaciona com todas as pautas que buscam uma sociedade mais justa e igualitária para todos e todas. Se relaciona com a luta dos trabalhadores, negros, LGBTs, indígenas, ambiental, entre outras. Essa abrangência e intersecção de pautas com outros movimentos faz com que o feminismo ganhe ainda mais força. Definitivamente, cada vez fica mais claro que serão as mulheres que mudarão o mundo. Lute como uma mulher! Lute como uma mulher negra!”, conclui a secretária-geral do Sindicato, Neiva Ribeiro.
Leia reportagens do Novembro da Resistência
> Políticas afirmativas ajudam a formar geração de intelectuais negros
> Filmes para refletir sobre a questão racial
> Seis episódios recentes que mostram o quanto o Brasil é racista
> Meu cabelo e a cor da minha pele te incomodam, por quê?
> Ivone Silva: 'Você entra numa agência e não vê um negro'.
> Quais são os desafios para a promoção da igualdade racial?
> Cine Birita encerra o Novembro da Resistência
> Filmes para debater a violência contra a mulher
> Sindicato inicia 16 Dias de Ativismo pelo Fim da violência contra a mulher
> Curta-metragem: O Brasil é um país racista?
> Por que o Brasil não pediu perdão pela escravidão?
> Por que não temos o mês da consciência branca?